O Brasil daquele tempo
Martha Batalha
Bolsonaro diz querer um Brasil de 40 anos atrás. Tenho 45 anos, e posso dizer o que vivi e aprendi sobre a época.
Naquele tempo havia dois tipos de mulher, a “pra casar” e a “pra transar”. Homens eram todos do mesmo tipo, e para eles a traição era assim como tomar uma dose extra de uísque. Algo que não deviam, mas podiam fazer sem vestígio de culpa. Homossexualismo era uma desgraça que acontecia só na família dos outros, e de preferência de uns outros que nem fossem nossos amigos, que era para o troço ficar bem longe.
Mulher branca com homem negro refinava petróleo, homem branco com mulher negra namorava a empregadinha. Assim mesmo no diminutivo, que era para a mulatinha de cabelinho pixaim ser assimilada como um bichinho. Quando negro atravessava a rua no lugar errado era porque queria virar asfalto, e quando não se sujava na entrada se sujava na saída (os que viveram a época entendem o eufemismo do dito). Muitos meninos eram iniciados sexualmente por uma empregada limpinha, e todo mundo ia à missa.
Nas festas de família, os homens se agrupavam em algum canto para sussurrar piadas de gays e de prostitutas. As de negros, fanhos, leprosos, judeus e mongoloides eram consideradas apropriadas ao resto da família. Quando a mulher se metia no assunto, algum homem dizia que a conversa ainda não tinha chegado na cozinha. Todos riam, inclusive a mulher.