Fragmentos de textos e imagens catadas nesta tela, capturadas desta web, varridas de jornais, revistas, livros, sons, filtradas pelos olhos e ouvidos e escorrendo pelos dedos para serem derramadas sobre as teclas... e viverem eterna e instanta neamente num logradouro digital.
Desagua douro de pensa mentos.
ódio é um afeto que se apresenta na política das mais diversas formas. Da mesma maneira que o ódio pode conduzir à morte e à destruição, é também um sentimento capaz de, paradoxalmente, nos levar a lutar por libertação ou a estabelecer formas ativas de solidariedade para com aqueles que sofrem.
Dito de outra forma, foi preciso odiar a escravidão e seus institutos para que ela pudesse ter fim; foi preciso odiar os nazistas e seus símbolos para derrotá-los. É imperioso odiar o fascismo e todos que o celebram. É imprescindível repudiar visceralmente e com todas as forças aqueles que humilham e destroem a vida de trabalhadores e de minorias.
Pela segunda vez em pouco mais de um ano, a polícia do Rio de Janeiro patrocinou uma chacina em que ao menos 23 pessoas consideradas "suspeitas" foram assassinadas em Vila Cruzeiro. Não era uma operação clandestina e nem uma ação de grupos paramilitares.
Era uma operação policial oficial que contou com o beneplácito do governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, com o costumeiro silêncio do sistema de justiça e com apoio de setores da sociedade, incluindo parte da mídia.
Um dia depois do massacre no Rio de Janeiro, policiais rodoviários federais, na cidade de Umbaúba, interior de Sergipe, imobilizaram e trancaram dentro de um camburão Genivaldo de Jesus Santos. Não sendo suficiente, os policiais jogaram uma bomba de gás no interior do veículo, o que resultou na morte de Genivaldo por asfixia. Ou seja: os policiais criaram uma câmara de gás improvisada e a utilizaram a vista de todos.
Em nota sobre o caso, disse a direção da PRF que, em razão da "agressividade" do homem, "foram empregadas técnicas de imobilização e instrumentos de menor potencial ofensivo para sua contenção e o indivíduo foi conduzido à Delegacia de Polícia Civil em Umbaúba".
Para além do evidente cinismo contido na expressão "menor potencial ofensivo", a mim me parece cristalino que essa declaração é parte de um sistema institucionalizado de execuções extrajudiciais.
Se alguém tinha alguma dúvida sobre o que é necropolítica, eis dois exemplos genuinamente brasileiros. Não se trata apenas de produzir a morte física, mas também a morte das possibilidades existenciais. Tirar a vida biológica é insuficiente; é preciso eliminar a memória que se tem sobre os mortos.
É necessário impedir homenagens e bloquear todos os ritos que possam dar algum sentido para a vida dos assassinados. Por este motivo, a polícia retorna aos territórios em que matou para destruir homenagens ou para tumultuar velórios.
Aterrorizar parentes, amigos, vizinhos dos mortos é parte crucial desse processo que visa não só garantir a impunidade, mas também a extirpar toda esperança de uma vida decente. A necropolítica é, afinal, esta mistura macabra de biopolítica, estado de exceção e estado de sítio que leva para favelas e periferias as técnicas de controle criadas nas plantations e nos campos de extermínio.
Para quem tem alguma dúvida sobre o que foi dito até aqui, serei ainda mais explícito: o Brasil, que há muito flertava, agora beija o nazismo na boca. Há setores da sociedade civil e da burocracia estatal que não tem mais qualquer pudor em defender o extermínio de populações inteiras, de deixar as pessoas morrerem de fome, de advogar o encerramento de serviços públicos essenciais, enfim, de matar pobres e minorias.
Com nazismo não se pode vacilar. Quem faz uso de símbolos, técnicas ou de discursos do nazismo é nazista, e nazistas devem ser tratados com todo o rigor possível, porque sua única serventia é provocar dor e sofrimento, sua única especialidade é matar.
Como disse Ulisses Guimarães é preciso ter ódio e nojo à ditadura —ditadura aliás, que muito se utilizou das lições nazistas de tortura e extermínio—, é preciso cultivar ódio e nojo a estes nazistas, assassinos e omissos aninhados no Estado brasileiro.
"Of course, Basquiat is not alone in such a transformation. Rather, he is the exemplar of a marketing strategy that has seen countless artists transmuted (sometimes willingly, other times not) into featureless, deracinated, and depoliticized products. As Elliot Safra details, museums and galleries in recent years have significantly expanded their retail wings while new companies, like home goods company Ligne Blanche, have arisen solely to market artist-branded products (predictably, the company has a Basquiat line). Perhaps no artist has exemplified the era of art-as-collectible better than KAWS, whose sales of art toys have revolutionized the art retail market in recent years.
In our contemporary cultural scene, the ideology of branding reigns and merchandising is generally understood to be integral to any aesthetic."
"If this is indeed accurate, what’s crucial for the Kremlin is that at the end of the current war, Ukraine is forced to agree to a truce that will be much more humiliating than what was envisaged by the Minsk agreements. If the war ends with Russia occupying all of Luhansk and Donetsk plus retaining control of the land corridor to Crimea, it will be more than enough for Putin to declare a spotless victory.
But to cement his victory, the Russian leader will need to convince Ukraine to agree to a truce under such conditions, and that’s a totally different story. Ukraine and its Western allies are hoping that under pressure from crippling sanctions Russia will eventually exhaust its military and economic potential and lose the battle."
Projeto militar é ter administração paralela ao presidente
Para o antropólogo Guilherme Lemos, da Universidade Federal de São Carlos, que pesquisa o papel das Forças Armadas no Brasil, o documento tem como base a criação de um Centro de Governo, que seria um órgão independente da administração federal e que cuidaria de implantar as propostas sem ser afetado pelas mudanças de governo resultantes do processo eleitoral.
"Equivale basicamente a você retirar das mãos civis, e sobretudo do próprio processo eleitoral e de alternância do poder da população escolhendo um representante, e colocar o poder nessa 'administração' do governo federal que não varia com as mudanças dos desejos do eleitor", alertou o pesquisador à coluna."
A política de segurança do "tiro na cabecinha" produziu no Rio de Janeiro, no intervalo de um ano, duas das operações policiais mais letais da história do estado. Foram 52 cadáveres no total —28 em maio de 2021, na favela do Jacarezinho; 24 agora, na Vila Cruzeiro. Incluindo-se na conta mortandades mais modestas, chega-se a um total de 39 chacinas, com 180 mortos.
Bolsonaro foi às redes sociais para parabenizar os "guerreiros" da polícia que passaram 24 pessoas nas armas, entre elas uma cabeleireira de 41 anos, que foi achada por uma bala perdida dentro de casa. O presidente criticou a imprensa por promover uma suposta "inversão de valores" que "isenta o bandido" de responsabilidade pelos seus "crimes cruéis".
É estranha a lógica do governante que invoca a crueldade da bandidagem para justificar a selvageria do estado. É como se o presidente declarasse, com outras palavras, que se horroriza tanto com a perversidade que deseja multiplicar a barbárie, transformando a prática da bandidagem em política de estado.
Quando o sangue e o discurso escorrem juntos no meio de uma campanha eleitoral, a incivilidade ganha ares de plataforma de governo. Bolsonaro ocupa a segunda colocação nas pesquisas presidenciais. No Rio, o governador Claudio Castro, herdeiro do cassado Wilson Witzel, mentor da doutrina da "cabecinha", disputa o topo das sondagens eleitorais. Ou seja: a incivilidade rende votos no Brasil.
O cidadão que autoriza a polícia a executar criminosos e avaliza o estado que assassina os assassinos se torna um cúmplice. O eleitor e contribuinte se autoconverte em mandante dos crimes. Se a selvageria estatal tivesse o efeito de dissuadir os bandidos, a frieza da vingança poderia ser apresentada como um fim prático para justificar os meios
monturo de cadáveres e a morte de inocentes —civis e fardados— sinalizam o plano da reciprocidade animalesca não está funcionando.
O estímulo para que policiais se comportem como bandidos transforma a segurança pública num torneio de facínoras. Isso conduz à Idade Média, não ao Renascimento.
O TCU libera a venda da Eletrobras. Voto solitário contra o negócio, Vital do Rêgo aponta os dolos da operação
"A cada dia que leio esse processo, mais eu sei que é um erro doloso”, afirmou. A parte brasileira de Itaipu está aos cuidados de uma estatal recém-cria-da, a ENBpar, que assumiu ainda a Eletronuclear, outra retirada da Eletrobras. Esta manteve 36% das ações preferenciais, sem direito a voto, da Eletronuclear, o que não muda com a privatização. Ou seja, particulares terão voz em negócios e na política nuclear. "
"A armadilha clássica para qualquer revolucionário é sempre: "Qual é a sua alternativa"? Mas mesmo que voce pudesse fornecer ao interrogador uma planta detalhada com alternativas, não significaria que iria usá-la. Na maioria dos casos está sendo insincero: nem quer saber da resposta. Na verdade, isto é uma ofensiva comum, uma técnica para desviar o furor revolucionário e voltá-lo contra ele mesmo. Além do mais, não é tarefa dos oprimidos convencer a todas as pessoas. Só precisam saber é que o sistema atual os está destruindo."
Unificar terceira via não faz sentido para candidatos e partidos
Nos últimos meses, análises sobre a viabilidade de uma alternativa a Lula e a Bolsonaro nas eleições de 2022 dominam boa parte do noticiário. Com o início da propaganda partidária no rádio e na TV, a abertura da janela para troca de legendas e a proximidade da data máxima para o registro das federações, as especulações ganharam ainda mais força.
O que estimula tanta discussão, além do inconfesso desejo de muitos analistas, está justamente na contradição de que muitos nomes foram colocados, mas nenhum até agora empolgou o eleitor.
As pesquisas recentes indicam que em torno de um quarto do eleitorado não gostaria de ver nem Bolsonaro e nem Lula recebendo a faixa presidencial. Esse percentual seria o bastante para colocar uma terceira opção no segundo turno, zerando o jogo da disputa eleitoral. O problema é que esse caminho está ultracongestionado com Ciro Gomes (PDT), Sergio Moro (Podemos), João Doria (PSDB), Simone Tebet (MDB) e muito provavelmente Eduardo Leite (PSD?).
As dificuldades para a unificação das candidaturas de terceira via são frequentemente atribuídas aos egos dos envolvidos, que se recusariam a abrir mão da primazia de serem escolhidos, em favor de apoiar um concorrente. Embora aspectos psicológicos sejam muito relevantes em decisões de tamanha importância, há razões estratégicas, do ponto de vista dos candidatos e dos partidos, que ajudam a explicar por que será tão difícil termos um concorrente único de terceira via nas urnas em outubro.
Quando um político almeja ser presidente da República, temos que entender que esse é um objetivo de uma vida; um projeto alimentado há anos e que deve ser visto como uma meta de longo prazo. Nessa caminhada, fracassos são inevitáveis, e mesmo as derrotas são encaradas como um passo atrás, que permitirá um salto maior no futuro.
Para um político que tem a pretensão de subir a rampa do Palácio do Planalto, uma candidatura à Presidência, mesmo fracassada, pode cumprir o papel de se fazer conhecido do grande público, ativo que pode ser de grande valia em outras tentativas mais à frente. Lula, aliás, é o maior exemplo dessa estratégia, não se abatendo depois de três derrotas (1989, 1994 e 1998) antes de alcançar sua meta em 2002.
Vários outros políticos, mesmo não sendo bem-sucedidos, também não se abalaram com fracassos e insistiram outras vezes: Brizola (cabeça de chapa em 1989 e 1994, vice em 1998), Marina Silva (2010 a 2018), José Serra (2002 e 2010) e até Enéas Carneiro (1989, 1994, 1998). Dois exemplos de persistência estão no jogo novamente agora em 2022: Ciro Gomes (candidato em 1998, 2002 e 2018) e Geraldo Alckmin, aspirante ao cargo em 2006 e 2018 e dado como certo no posto de vice de Lula neste ano.
Todos os candidatos no páreo pela “terceira via” são relativamente jovens e terão ainda outras oportunidades para tentar a sorte. Sendo assim, insistir na candidatura, mesmo com baixas chances de vitória, é uma oportunidade para se tornarem conhecidos, para além de suas bolhas ou redutos regionais.
Continuar na disputa a qualquer custo faz ainda mais sentido porque 2026 está logo ali e muito provavelmente não haverá mais a polarização Lula/Bolsonaro, seja por causa da idade (Lula terá 81 anos) ou pela impossibilidade de reeleição, na hipótese de Bolsonaro vencer.
Além disso, nenhum tem opção mais atraente do que concorrer à Presidência. Ciro perdeu o tesão pela vida parlamentar, Doria enfrenta rejeição em São Paulo, Tebet teria concorrentes fortes para o Senado por Mato Grosso do Sul, Leite já colheu os frutos de uma boa administração no Rio Grande do Sul e Moro teria que renegar a origem paranaense para concorrer ao Senado, pois lá a vaga de seu partido é de Álvaro Dias.
Outra força que conduz à fragmentação de candidaturas no espectro entre Lula e Bolsonaro parte dos partidos. Como mostra a tabela, ter representante na briga pela Presidência, mesmo com baixa probabilidade de vitória, pode puxar votos para uma bancada maior no Congresso, o que aumenta o poder de barganha nas negociações legislativas e proporciona fatias mais generosas dos fundos eleitoral e partidário. Há muito wishful thinking em relação à unificação da terceira via, mas, bem lá no fundo, nem seus integrantes, nem seus partidos, desejam que isso se torne realidade."
Klaus Schulze, Pioneering Electronic Composer, Is Dead at 74
""Mr. Schulze’s music encompassed the psychedelic jams of early krautrock, orchestral works, song-length tracks with vocals, an electronic opera and brief soundtrack cues. Much of his music was extended and richly consonant, using drones, loops and echoes in ways that forecast — and then joined and expanded on — both immersive ambient music and beat-driven techno and trance music.
He was habitually reluctant to describe or analyze the ideas or techniques of his music. “I am a musician, not a speaker,” he said in a 1998 interview. “What music only can do on its own is just one thing: to show emotions. Just emotions. Sadness, joy, silence, excitement, tension.”"
Se há um único programa de Jair Bolsonaro que contou com planejamento de longo prazo e dedicação de diferentes áreas do governo, esse projeto é o ataque às urnas eletrônicas. O presidente mobilizou auxiliares desde o primeiro ano de mandato para fabricar suspeitas sobre a votação e reforçar seu arsenal golpista.
Bolsonaro parece desconfiar há tempos da própria capacidade de ficar no poder pela via democrática. Ainda no final de 2019, o ministro Luiz Eduardo Ramos telefonou para um técnico em eletrônica e pediu dados sobre possíveis fraudes nas urnas, como mostrou a Folha. O assunto era considerado tão sério que o general marcou um encontro do informante com o presidente.
Na época, Bolsonaro já mostrava vontade de melar a eleição. Em novembro daquele ano, ele pegou carona numa suspeita de fraude na Bolívia e lançou nas redes sociais a ideia de implementar o voto impresso no Brasil. Nos corredores do Planalto, seus aliados usavam a máquina do governo para fortalecer o plano.
A ofensiva nasceu como uma ação coordenada. Além de Ramos, um coronel lotado no palácio coletava informações sobre as urnas. Pouco tempo depois, a Agência Brasileira de Inteligência acionou um perito da Polícia Federal em busca de dados sobre ocorrências com o sistema eletrônico de votação.
O medo da derrota levou Bolsonaro a profissionalizar e reforçar o programa. Depois do convite do TSE para que as Forças Armadas integrassem uma comissão de transparência, o presidente incluiu a campanha contra as urnas na agenda militar do governo. No início deste mês, ele chegou areunir comandantes num almoço para discutir as eleições.
O golpismo é premeditado e organizado —um cenário distante das generosas avaliações de que Bolsonaro só dispara bravatas para animar sua base eleitoral. Ao longo do tempo, o governo ofereceu aos delírios autoritários do presidente mais tempo e energia do que mereceram a fome,a inflaçãoou a vida de milhares de brasileiros na pandemia.
'Bolsonaro é um inimigo declarado dos povos indígenas'
"O aumento da violência nos territórios indígenas é parte da estratégia política do governo Bolsonaro, baseada no ódio e no neofascismo. A avaliação é de Sônia Guajajara, liderança indígena que deve disputar uma vaga de deputada federal por São Paulo... Leia mais em https://www.cartacapital.com.br/entrevistas/fera-a-espreita/. O conteúdo de CartaCapital está protegido pela legislação brasileira sobre direito autoral. Essa defesa é necessária para manter o jornalismo corajoso e transparente de CartaCapital vivo e acessível a todos"
leia entrevista de Sonia Bone Guajajara para Fabiola Mendonca
Well I know I said that so long ago
I would not say it now
But I didn't know what I said would stick like glue
What I said in the days gone by
Well they tried to stitch me up
With so many words I said, I said so long ago
Bet we were all so young and foolish then
Hopefully we can make mistakes and then we grow
"Ferdinand Marcos, o ditador que governou as Filipinas de 1965 a 1986, foi o herói mais condecorado do país na Segunda Guerra Mundial. Sob seu governo, as Forças Armadas eram as mais avançadas da Ásia. Ainda mais impressionante: sua família possui enormes quantidades de ouro, o suficiente para salvar o mundo (foi dado a Marcos por uma família real como pagamento por atuar como seu advogado). Será compartilhado com a população se eles recuperarem o poder.
As afirmações são todas falsas. Mas isso não impediu que repercutissem nas redes sociais e saturasse os feeds de notícias nas Filipinas. Ferdinand Marcos deixou o cargo em desgraça há 36 anos, deposto pela Revolução do Poder Popular, que atraiu milhões para as ruas e forçou a família a fugir do palácio presidencial de helicóptero. Mas, no último domingo 8, a família Marcos marcou sua volta ao poder. Cerca de 67,5 milhões de filipinos foram às urnas para decidir quem substituiria o presidente populista Rodrigo Duterte, que chegou ao fim de seu mandato de seis anos e não podia concorrer novamente.
O único filho de Marcos, Ferdinand Marcos Jr., conhecido como Bongbong, confirmou o favoritismo e obteve mais do dobro dos votos da concorrente, Leni Robredo, ex-advogada de direitos humanos e atual vice-presidente. Analistas descreveram a corrida como uma luta pela verdade e o ápice de uma campanha de décadas para reescrever a história e reabilitar o nome Marcos. A eleição não foi disputada apenas com dados e evidências, disse Ronald Mendoza, reitor da Escola de Governança Ateneo, em Manila: “É uma batalha de desinformação”.
Os Marcos e seus apoiadores tentam revisar a história de sua época e da lei marcial imposta em 1972, muitas vezes descrita como um dos episódios mais dolorososo país. Eles negam ou descartam a torturara generalizada documentada por grupos de direitos humanos, as execuções extrajudiciais e o roubo de bilhões de dólares.
Em vez disso, o período é retratado como uma era dourada de paz e prosperidade. Para os sobreviventes do regime de Marcos, a aceitação de tais relatos por parcelas significativas do público é incompreensível."
"Acordo de boca para empresas de Musk devassarem, por satélite e por
meios terrenos, o maior patrimônio natural do território, sobretudo a
sua riqueza mineral, de importância decisiva para o amanhã do país.
Acordo de boca, de pessoa a pessoa, sem interveniência de qualquer das
instituições oficiais ao menos como consulta. Acordo de boca para
interesses estrangeiros fazerem na e da Amazônia o que quiserem, como se
o território deixasse de ser brasileiro, passando ao domínio de fato de
poderes externos, situação de território ocupado. As empresas
americanas no exterior estão sob o compromisso, compulsório, de
sujeitar-se ao alegado interesse nacional dos Estados Unidos.
Enquanto seu principal adversário desfrutava a lua de mel, Jair
Bolsonaro convocou a imprensa para divulgar um novo relacionamento. “É o
início de um namoro. Tenho certeza que vai acabar em casamento
brevemente”, anunciou. O capitão se referia ao flerte com o bilionário
Elon Musk, que fez uma visita-relâmpago ao Brasil na sexta-feira.
Em campanha à reeleição, Bolsonaro tirou o dia para bajular o homem
mais rico do mundo. “Poderíamos chamá-lo de mito da liberdade”,
derramou-se. Ele definiu o anúncio da compra do Twitter, um negócio de
US$ 44 bilhões, como um “sopro de esperança”. “A vinda dele é um marco
para todos nós”, proclamou, antes de condecorá-lo com uma medalha.
O ministro Fábio Faria, que organizou a visita, foi ainda mais longe
na vassalagem. “Todos no Brasil te amam”, disse a Musk. Não era só o
complexo de vira-latas, identificado por Nelson Rodrigues como um traço
da psiquê nacional. Os bolsonaristas cortejam o bilionário porque têm
muitos interesses em jogo. Os mais visíveis estão ligados à regulação
das redes.
A extrema direita vibrou quando Musk quando prometeu reativar a conta
de Donald Trump no Twitter. O ex-presidente americano foi banido da
plataforma após incentivar a invasão do Capitólio. Bolsonaro já ameaçou
provocar uma arruaça maior se for derrotado nas urnas.
O capitão e seus seguidores são contra qualquer barreira ao discurso
de ódio nas redes. Dizem defender a liberdade, mas querem manter a
internet como território livre para as fake news. Além de simpatizar com
essa causa, Musk exibe outras afinidades com a turma. No início da
pandemia, menosprezou os riscos da Covid e fez propaganda da cloroquina.
Na sexta, Bolsonaro disse que o magnata vai ajudá-lo a desfazer
“mentiras” e mostrar que a Amazônia “é preservada por nós”. Interessado
em riquezas minerais, Musk anunciou que seus satélites vão colaborar com
o “monitoramento ambiental” da região. Ninguém apresentou detalhes ou
custos do serviço.
O Brasil já tem um bom sistema de vigilância da floresta. É operado pelo Inpe, que Bolsonaro tenta sucatear. O que ameaça a Amazônia não é a falta de satélites, e sim a parceria do capitão com os desmatadores.
O dono da Starlink é um homem de negócios. Veio ao Brasil para
multiplicar sua fortuna, não para fazer caridade. Tipos assim têm mais a
ganhar quando são recebidos por um governo de joelhos.
Projeto de militares prevê manter poder até 2035 e fim da gratuidade no SUS em 2025
O vice-presidente Hamilton Mourão esteve presente à solenidade de lançamento do programa. Foto: Adriano Machado/Reuters
MARCELO GODOY
Caro leitor,
Houve um tempo em que os militares mandavam no País e celebravam seus feitos com a música Eu Te Amo Meu Brasil. O velho hit dos Incríveis
soou novamente em uma solenidade em Brasília, executado pela fanfarra
do Regimento de Cavalaria de Guardas. Era dia 19 de maio. Os Institutos
Villas Bôas, Sagres e Federalista apresentaram o seu Projeto de Nação, O Brasil em 2035 em evento que contou com a presença do vice-presidente Hamilton Mourão.
O general diz que o estudo está à
disposição de todos – Mourão e um representante do governo estiveram na
solenidade e receberam um exemplar. “Mesmo que haja mudança de governo.
Claro que se for de direita para esquerda, vai jogar fora.” O documento
aborda 37 temas estratégicos. Trata de geopolítica, governança nacional,
desenvolvimento, ciência, tecnologia, educação, saúde, defesa nacional e
segurança. A Amazônia é citada dentro do tema Defesa Nacional, no capítulo Integração da Amazônia no Brasil.
O projeto diz que a Nação está ameaçada pelo “globalismo”.
Diz o documento: “O chamado globalismo, movimento internacionalista
cujo objetivo é determinar, dirigir e controlar as relações entre as
nações e entre os próprios cidadãos, por meio de posições, atitudes,
intervenções e imposições de caráter autoritário, porém disfarçados como
socialmente corretos e necessários. No centro desse movimento está a
elite financeira mundial, ator não estatal constituído por
megainvestidores, bancos, conglomerados transnacionais e outros
representantes do ultracapitalismo, com extraordinários recursos
financeiros e econômicos”.
Para Eduardo Villas Bôas,
Mourão, Rocha Paiva e associados, o globalismo tem aliados poderosos no
Brasil. Afirma o documento: “O globalismo tem outra face, mais
sofisticada, que pode ser caracterizada como ‘o ativismo judicial
político-partidário’, onde parcela do Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública
atuam sob um prisma exclusivamente ideológico, reinterpretando e
agredindo o arcabouço legal vigente, a começar pela Constituição
brasileira.” A ideologia da extrema direita está em outros trechos do
projeto.
O documento prevê que a classe média deve pagar mensalidades nas universidades públicas e pelo atendimento no SUS.
A cobrança deve começar em 2025. “Além disso, a partir de 2025, o Poder
Público passa a cobrar indenizações pelos serviços prestados,
exclusivamente das pessoas cuja renda familiar fosse maior do que três
salários mínimos.” Mourão e os seus amigos para sempre – outra música da
cerimônia – pretendem acabar com a Saúde gratuita e universal num
segundo mandato de Bolsonaro.
Na Educação, o grupo demonstra ainda o desejo de limitar o debate acadêmico e a liberdade de cátedra,
garantidos pela Constituição, impondo sua visão de mundo a estudantes e
professores. O projeto traça o seguinte cenário para 2035: “Os
currículos foram ‘desideologizados’ e hoje são constituídos por
avançados conteúdos teóricos e práticos, inclusive no campo social,
reforçando valores morais, éticos e cívicos e contribuindo para o
progressivo surgimento de lideranças positivas e transformadoras”.
Aos militares cabe nos contar o que é
“desideologização”. O dono da melhor explicação ganhará um cargo
vitalício no futuro Ministério da Verdade. O documento prossegue. Os generais acreditam que as salas de aula estão dominadas por esquerdistas.
“Há tempos uma parcela de nossas crianças e adolescentes sofria com a
ideologização do sistema educacional, com a doutrinação facciosa
efetuada por professores militantes de correntes ideológicas utópicas e
radicais, com prejuízo da qualidade do ensino”.
Ou se desconhece o que se passa nas escolas do Brasil ou o que se quer é impor a própria ideologia, controlar a história e a memória nacionais
como normalmente fazem os regimes totalitários de direita ou de
esquerda. O documento faz esse diagnóstico sobre o ensino superior:
“Quanto à Educação Superior, o quadro não era muito diferente. Amplos
setores das Instituições de Ensino Superior (IES) — principalmente as
públicas — transformaram-se em centros de luta ideológica e de
doutrinação político-partidária”.
Ele continua afirmando: “Em sala de
aula, pouco era feito no sentido de transmitir os conteúdos, ensinar o
aluno a pensar, orientar as pesquisas sobre as diversas correntes de
pensamento e elucidar sobre como realizar as melhores análises, buscando
as opções de vida mais favoráveis, segundo as crenças e convicções de
cada aluno. Tudo era feito para que o aluno fosse obrigado a pensar
exatamente como pensava o professor, caso contrário não conseguiria se
formar e tampouco seria aceito pelo grupo”.
O general Luiz Eduardo Rocha Paiva, coordenador do Projeto de Nação Foto: Dida Sampaio/Estadão
Para Mourão e Villas Bôas, tudo estará mudado em 2035.
Diz o documento: “No ensino universitário, inclusive no Superior
Tecnológico, os debates políticos e ideológicos se tornaram
equilibrados, com abertura para diferentes correntes de pensamento”.
Como fazer isso sem violar a autonomia universitária, a liberdade de
cátedra e a liberdade de pensamento é o que mais uma vez não se
esclarece. E quem pedir explicações corre o risco de ser acusado de
comunista ou de ofender as Forças Armadas.
Toda vez que confrontados com seus atos, os militares que embarcaram no governo de Jair Bolsonaro
reagem se escondendo atrás do biombo das Forças Armadas. Tentam fazer
com que o suposto agravo individual se torne ofensa coletiva. E, assim,
deixam de prestar contas pelo que fazem como se agissem em nome de seus
pares. Sem serem julgados, fazem avançar uma amnésia moral.Hannah Arendt tratou dessa falácia em Responsabilidade e Julgamento com a fórmula hoje clássica: “Quando todos são culpados, ninguém o é”.
É que a culpa é estritamente pessoal ao
passo que a responsabilidade não. A primeira refere-se a um ato e não a
intenções e potencialidades. Quem diz “somos todos culpados” declara
solidariedade aos malfeitores ou pretende ser protegido, apesar de sua
falha, por quem se sente responsável pelos atos de seu grupo, família ou
Nação. Enfim, quem usa o biombo da instituição ou do governo quer mobilizar a responsabilidade coletiva, que só é afastada quando individualmente deixamos um grupo.
Mas em uma República são as pessoas que
são julgadas e respondem por seus atos. Assim, o governo Bolsonaro é
também responsável pelo projeto de Villas Bôas e de Rocha Paiva, mas só
os seus autores podem ser culpados pelo barulho que o documento causar na campanha eleitoral do presidente.
Afinal, será difícil explicar à classe média empobrecida pela inflação
que ela terá de arcar com os custos do SUS e da universidade pública
quando conseguir ser atendida por um médico ou seu filho obtiver uma
vaga após muito estudar.
Será
Mourão que terá de dizer ao mercado financeiro internacional o que
significa tomá-lo como inimigo. Ou como pacificar a Nação quando o
retrato do Brasil que se pretende criar é o de uma democracia sem
alternância de poder, impondo um modelo de desenvolvimento à Amazônia que a trata segundo o conceito de ocupar e integrar,
dos anos 1970 – o documento diz que se deve acabar com “restrições da
legislação indígena e ambiental, que se conclua serem radicais nas áreas
atrativas do agronegócio e da mineração”.
Rocha Paiva pensa que “vontade é poder”.
Precisava ler Arendt para saber o quanto a liberdade depende da ação
coletiva e não da vontade. Normalmente, só políticos autoritários
acreditam na força da vontade. Falar em neutralizar – uma linguagem
militar – ideologias para impor a própria, nomeada como “conservadora
evolucionista”, faz lembrar a pergunta que o jornalista Rolf Kuntz lançou no Estadão sobre o governo: “Haverá alguma diferença entre seu suposto liberalismo econômico e um efetivo darwinismo social?”
Michel Temer teve no Ponte para o Futuro,
o plano que o guiou no governo. Bolsonaro e seus militares têm agora –
palavras do antropólogo Piero Leirner – o seu “Ponte para o Passado”.
Tudo ao som de Eu Te Amo Meu Brasil.
Hannah Arendt em seu apartamento, em Nova York, em 1972. Foto: Tyrone Dukes/NYT ESTADAO
Bolsonaro recebeu Elon Musk com rapapés e tapete vermelho, em cena de vassalagem vira-lata explícita. Como se sabe, Musk negocia a compra do Twitter e já avisou que a liberdade de expressão absoluta na rede social, sem qualquer moderação, está acima de tudo. Música para os ouvidos das milícias digitais e sinal verde para a pregação golpista e os discursos de ódio.
Musk anunciou que quer reverter o banimento de Donald Trump, expulso do Twitter por ter insuflado extremistas contra a confirmação de Joe Biden, em janeiro de 2021. A ação resultou na invasão do Capitolio e na morte de cinco pessoas.
Homem mais rico do mundo, dono de um império de empresas de alta tecnologia, que vão dos carros elétricos à pretensa colonização de Marte, Musk é um oligarca de perfil ególatra e megalômano.
Ficou famoso seu tuíte sobre o golpe na Bolívia, contra Evo Morales, em 2019. Respondendo à crítica de um seguidor, tuitou: "Nós daremos golpe em quem quisermos. Lide com isso." A Bolívia tem as maiores reservas de lítio do mundo, mineral essencial para as baterias de carros elétricos fabricados pela Tesla.
O oligarca se meteu na guerra da Ucrânia, fornecendo equipamentos da sua rede de satélites, a Starlink, que, segundo a imprensa britânica, está tendo uso não apenas civil, mas também militar, contra as forças russas.
Agora, Musk aparece no Brasil para, supostamente, cobrir a Amazônia com internet para monitorar os lugares mais remotos, num contrato sem licitação. No Twitter, o oligarca ofereceu um motivo singelo: conectar escolas rurais. Em momento pré-eleitoral, com disparada do desmatamento e ofensiva da mineração sobre terras indígenas? Conta outra.
O poder quase incontrolável das big techs tem mostrado graus variados de impacto negativo para as democracias, em vários países. A passagem meteórica de Musk pelo Brasil faz soar um alarme (mais um) sobre enormes riscos de manipulação envolvendo a eleição de outubro.
Bolsonaro e Elon Musk em encontro em Porto Feliz (SP) -Kenny Oliveira/Ministério da Comunicações/AFP