Mark Zuckerberg decidiu cancelar o fact checking no Facebook e disponibilizar a rede social como plataforma para a extrema direita.
Há duas explicações possíveis para a mudança: ou Zuckerberg está com medo ou é corrupto. Elas podem ser verdade ao mesmo tempo.
Na primeira hipótese, Zuckerberg e outros bilionários temem sofrer
retaliações de Trump se não doarem dinheiro, ou se não fizerem a vontade
do governo. Na segunda hipótese, o Vale do Silício percebeu que Elon Musk
vai ganhar dinheiro (com regulação das redes, ou das criptomoedas, ou
com protecionismo contra a concorrência chinesa) por ter se aliado a
Trump, e resolveu correr atrás de boquinha semelhante.
A manchete é uma dessas duas: Zuckerberg acha Trump um ditador ou
Zuckerberg acha Trump corrupto. Liberdade de expressão não é o assunto
aqui.
O tom do pronunciamento não deixa dúvida: o bilionário do Facebook mudou de posição para puxar o saco de Donald Trump.
Usou os mesmos termos da extrema direita para atacar a mídia
profissional e os fact checkers que trabalhavam sob suas instruções até
um dia antes.
Na lista de temas
em que Zuckerberg autorizou a desinformação, só há assuntos caros à
direita: imigração e gênero. De maneira nada sutil, o Facebook vai mudar
seus moderadores de conteúdo da progressista Califórnia para o
conservador Texas. Nem mesmo os inofensivos temas para o aplicativo do
Facebook que celebravam a igualdade de gênero escaparam: Zuckerberg mudou seus nomes de "orgulho" para "arco-íris" e de "transgênero" para "algodão-doce".
Se Zuckerberg agia em nome da liberdade de expressão, poderia ter
feito também gestos em favor da extrema esquerda: por exemplo,
declarando como legítimas campanhas para matar CEOs de planos de saúde
americanos. A evidência sugere que essa causa empolgaria muito mais
americanos do que o direito de chamar transexuais de doentes.
Eu seria contra. Acho necessário que haja barreiras contra o
extremismo no debate público. Mas Zuckerberg acabou de dizer que isso é
censura.
Vamos lá, Marquito, defenda também a liberdade de o pessoal organizar o assassinato de gente como você.
Afinal, você e seu amigo Musk defendem o direito de os bolsonaristas organizarem o assassinato de gente como eu.
Sua mentira sobre "cortes secretas" ecoa a reivindicação da extrema
direita brasileira sobre a atuação do STF contra os golpistas de
Bolsonaro. Uma investigação da Polícia Federal,
cujos resultados já são públicos faz tempo, mostrou por que os
bolsonaristas queriam acesso às redes sociais durante a eleição de 2022:
para espalhar a mentira de que houve fraude nas urnas eletrônicas. A
investigação provou, inclusive, que Bolsonaro e seus aliados sabiam que não houve fraude nas urnas. Com o argumento da fraude, tentaram dar um golpe para matar a democracia brasileira.
Se o golpe tivesse dado certo, eu e todos os que nos opusemos ao
autoritarismo de Bolsonaro estaríamos mortos. Musk seria a favor disso.
Zuckerberg provavelmente só não se importaria, desde que seus impostos
continuassem baixos.
E para quem escreveu coluna tratando essa história como um debate
sobre princípios, liberdade, essas coisas, sugiro que da próxima vez
contrate um fact checker.
FOLHA