De Helio Schwartsman
A coluna de quarta, na qual sustentei que é necessário legalizar
todas as drogas, não só descriminalizar o consumo, gerou interessantes
indagações de leitores. Uma que merece desenvolvimento diz respeito ao
que fariam os traficantes com a eventual legalização.
A resposta é obviamente empírica, mas como nenhum país legalizou ainda
todas as drogas, não sabemos o que aconteceria. Só o que podemos fazer é
colocar a imaginação para funcionar, mas mantendo-a sob as rédeas
curtas do realismo.
Até dá para sustentar que grandes produtores conseguiriam integrar-se à
cadeia legalizada, mas esse dificilmente seria o destino dos pequenos
traficantes e seus soldados. Eles não vestiriam uma gravata e se
tornariam respeitáveis homens de negócios. O mais provável é que a maior
parte continuasse na vida do crime, possivelmente trocando o comércio
ilícito por delitos bem mais violentos, como roubo ou sequestros. Assim,
não seria uma surpresa se, num primeiro momento, a legalização
resultasse numa alta da criminalidade.
Em prazos mais dilatados, porém, dá para vislumbrar o enfraquecimento
dos carteis de traficantes. Privados do lucro fácil das drogas, já não
teriam tantos recursos para corromper autoridades e manter exércitos de
capangas. De novo, essa não é necessariamente uma boa notícia. Policiais
não gostam muito da tese, mas certos pesquisadores dizem que o
fortalecimento de organizações como o PCC, que impõe rígida disciplina a
seus comandados, ajudou a reduzir os homicídios em São Paulo.
Com tantos riscos, por que insistir na legalização? Cabe aqui uma
analogia com ditaduras. Tiranias antigas tendem a ser menos violentas.
Os principais opositores já foram suprimidos e a população aprendeu o
que não é tolerado. Não obstante, ninguém defende que ditaduras velhas
sejam mantidas porque a transição pode ser violenta. Devemos derrubá-las
porque é a coisa certa a fazer.