de Celso Rocha de Barros
O Congresso se vende nesta segunda-feira?
Hoje acontece a eleição para presidente da Câmara dos Deputados. De um lado, concorre Baleia Rossi (MDB-SP), representando uma frente ampla com forças de esquerda e de direita. Do outro lado, Arthur Lira (PP-AL), representando o direito de Jair Bolsonaro pisar no tubo de oxigênio de 220 mil brasileiros que morreram asfixiados durante a pandemia. Lira é favorito.
Se a vitória de Lira se confirmar, Bolsonaro terá três vitórias.
A vitória menor será a eleição de Arthur Lira. Com um aliado seu na presidência da Câmara, Bolsonaro terá mais chances de colocar em votação suas pautas autoritárias. Se entregar cargos conversíveis em dinheiro for suficiente para eleger Lira, talvez também seja suficiente para aprová-las.
Com todas as suas imperfeições, Rodrigo Maia foi um limite para o autoritarismo de Bolsonaro. Lira parece ter menos disposição para sê-lo.
Até outro dia, diziam que o centrão de Lira havia moderado Bolsonaro. Da próxima vez, sugiro que a democracia brasileira não se defenda com um exército mercenário. O leilão do mercenário está sempre em aberto.
Mas, até por isso, mesmo, a vitória de Lira pode não ser uma vitória tão grande para Bolsonaro.
Se a maré virar contra o presidente, como parece estar virando, essa turma toda vai embora em cinco minutos, carregando até o material de escritório da Esplanada. E a munição usada para eleger Lira já está gasta; não haverá mais tantos cargos nem tantas verbas para distribuir na próxima disputa.
Mesmo assim, faz diferença. Em uma disputa apertada pelo impeachment, um presidente da Câmara que vacile por, digamos, dois meses a mais para ouvir a insatisfação popular pode ser decisivo. A mobilização pode arrefecer nesse período, a próxima eleição pode começar a ficar perto demais.
É bom lembrar que o presidente mais impopular de todos os tempos, Michel Temer, escapou do impeachment de manobra em manobra. Todas foram do tipo que Bolsonaro está fazendo agora.
Mas a vitória de Lira daria a Bolsonaro outras duas vitórias, talvez mais importantes.
A primeira é um novo salto na desmoralização do Congresso. Se, depois dos 220 mil mortos e da tentativa de autogolpe de 2020, o Congresso se vender para quem até outro dia queria fechá-lo, haverá menos gente para defendê-lo na próxima ameaça autoritária.
Tem gente no centrão que diz que parou o golpismo de Bolsonaro em 2020 sozinho, mas é mentira: havia uma resistência ao autoritarismo na opinião pública e o centrão entrou como mediador.
Se Lira vencer e fizer o que o bolsonarismo quiser, o centrão não será mais mediador de nada. Terá lado na disputa e mãos manchadas de sangue.
Além disso, se Lira vencer, a frente ampla terá fracassado de novo, depois da vez em que ela mais importava —o segundo turno de 2018— e daquela movimentação tímida de 2020.
Nesse caso, da próxima vez que a direita disser “nós votamos Bolsonaro porque do outro lado era o PT” bastará responder “meu amigo, vocês votaram no Bolsonaro quando do outro lado era o Baleia Rossi”.
Enfim, é hora do Congresso decidir o quanto os democratas brasileiros podem contar com ele. Gostaria de ter argumentos que convencessem os eleitores de Arthur Lira a mudar de ideia. Mas acho que acabaria gastando-os para comprar o Messi para o Flamengo.