"A condição de não gente, de inexistir na categoria dos humanos, parece ser o status dos povos da floresta no caminho das grandes obras amazônicas ao longo da história do Brasil.
Ao anunciar que “as primeiras hidrelétricas do tipo plataforma (São Luiz e Jatobá, no Tapajós) seriam licitadas até o fim de 2014”, a Agência Brasil entrevistou Maurício Tolmasquim, presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), responsável pela realização dos estudos para o planejamento do setor energético. Ele explicou que esse tipo de hidrelétrica “será usado em áreas da floresta amazônica onde não há ocupação humana”. A explicação ecoa um dos slogans da ditadura civil-militar para a Amazônia, nos anos 70: “Terra sem homens para homens sem terra”. Ou a famosa expressão, também muito popular naqueles anos tenebrosos: “Deserto verde”. Ou ainda: “Ocupar para não entregar”. Entregar para quem?, é a pergunta óbvia e, lamentavelmente, ainda atual na democracia tão duramente conquistada, inclusive pela atual presidente. Talvez seja entregar para os índios, os ribeirinhos, os quilombolas, aqueles vistos como “estrangeiros” pela parcela do Brasil a qual convém desconhecê-los.
Parece que nada se aprende com o passivo ambiental e humano deixado por hidrelétricas como Balbina e Tucuruí, nas quais populações oficialmente “não afetadas” foram obrigadas a deixar sua terra, sem receber um centavo do governo, por absoluta impossibilidade de nelas seguirem vivendo a partir do momento em que o ciclo da natureza foi alterado. A comunidade de Montanha e Mangabal poderá ainda ser cortada pelo meio com a implantação da segunda hidrelétrica planejada para a região, a de Jatobá. De fato, não é que nada se aprende, apenas não importa o destino dessas populações para setores do Brasil, como prova a História. Esses setores estão sempre bem representados nos mais variados governos, como também está provado."
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Eliane Brum
A não gente que não vive no Tapajós | Opinião | Edição Brasil no EL PAÍS:
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LILO CLARETO