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  • O BRASIL EH O QUE ME ENVENENA MAS EH O QUE ME CURA (LUIZ ANTONIO SIMAS)

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    sexta-feira, novembro 04, 2022

    Receita para lavar a alma

     


    Ilustração mostra duas crianças correndo carregando a bandeira do Brasil, delas saem coraçõezinhos vermelhos.
    Ilustração de Catarina Bessell 

    Gregorio Duvivier

    Taí uma das expressões mais bonitas da nossa língua: lavar a alma. E mais difíceis de traduzir também. Sobretudo pra mim, que não falo bem língua nenhuma. Mas uma amiga, tradutora e poliglota, me confirmou. Não se lava a alma noutras línguas, que ela saiba. Quer dizer, não do mesmo jeito. Pode-se ganhar "by a landslide" —ou de lavada. Mas ganhar lavando a alma não tem nada a ver com ganhar de lavada. A lavada não lava a alma —necessariamente. Ao contrário: é a vitória suada que costuma lavar melhor a alma.

    Lava-se a alma quando se ganha, mas não basta ganhar pra lavar a alma. Ganhar de bandeja não lava a alma de ninguém. Uma vitória esperada não faz cosquinha na alma. Pior: uma alma com o hábito da vitória pode continuar cheirando a mofo, coitada.

    A vitória injusta tampouco lava a alma. Dá um banho de água suja. Quando se ganha perdendo, a alma fica ainda mais fedida. Ganhar de um amigo querido, ou de um adversário honesto, tampouco serve pra lavar a alma.

    A vitória precisa ter gosto de justiça. A alma precisa merecer o banho. Por isso a injustiça costuma anteceder a lavagem. E a dúvida, também: será que algum dia lavarei minh’alma?

    Pra dar um bom banho n’alma, é preciso ter perdido batalhas. Mas não apenas uma vez só. É preciso ter perdido por meses, anos, décadas, quem sabe uma vida toda. É preciso ter esquecido o gosto da vitória. E enfrentado muita sujeira pelo caminho.

    A alma precisa ter passado por algum deserto pra merecer o bom banho. E não só: a alma precisa ter botado o corpo pra jogo e amargado o sabor da derrota injusta. Quem lava as mãos não sabe o que é lavar a alma. Os cínicos tomam menos banho n’alma que os franceses no corpo. Os franceses, no entanto, lavaram a alma em 1789. Os haitianos lavaram a alma em 1791. Os russos lavaram a alma em 1917, os portugueses lavaram a alma em 1974, os sul-africanos lavaram a alma em 1994.

    Já nós, brasileiros, quantas vezes não tentamos. Da Inconfidência às Diretas Já, nossa história foi uma longa sucessão de banhos n’alma interrompidos por falta d’água. Lavamos a alma nas copas, e faz tanto tempo.

    Chegou o grande dia. A vitória eleitoral da sociedade civil contra um projeto de autocracia miliciana e fundamentalista não tem outro nome: lavamos a alma. Esse banho vai ser demorado. Muita sujeira ainda precisa escorrer pelo ralo. Mas que delícia é sentir a alma de um povo lavada inteira.

    FOLHA 


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