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    quinta-feira, novembro 03, 2022

    Bolsonarismo assume seu desprezo pela democracia

     

     Bolsonaro pede a apoiadores liberação de rodovias e diz:

    Leonardo Sakamoto

     

    Nem bem Jair Bolsonaro perdeu a eleição e a extrema direita que o apoia cerceou o direito de ir vir de milhões de brasileiros, usou crianças como escudo humano em São Paulo, fez saudações nazistas em Santa Catarina e pediu golpe militar com expurgo de adversários. Agora, imaginem o que aconteceria se ele tivesse ganho.

    Por mais incômodo que pareçam, os bloqueios de caminhoneiros bolsonaristas e as manifestações de extrema direita que reuniram milhares de pessoas na frente dos quartéis com o intuito de contestar as eleições não se comparam ao que seria a assustadora instalação de um estado autoritário. O que certamente ocorreria com mais quatro anos de Bolsonaro.

    Em outras palavras, uma tentativa de golpe (que já nasce inviável devido ao reconhecimento da vitória de Lula pelas instituições brasileiras, os governos estrangeiros e o grosso dos investidores e do empresariado) é menos preocupante do que um golpe em si.

    Durante quatro anos, o malabarismo retórico de aliados do presidente tentou vender a falsa ideia de que eram apenas alguns poucos malucos que defendiam "intervenção militar" nas manifestações bolsonaristas. As imagens em frente aos Comandos Militares do Leste e do Sudeste, no Rio e em São Paulo, mostraram que não são. A diferença é que, agora, seguidores radicais de Jair perderam o pudor de assumirem seu golpismo. E, em alguns casos, o seu fascismo.

    Bolsonaro adubou seu rebanho com uma realidade paralela através de narrativas enviadas por redes sociais e aplicativos de mensagens. Praticamente, proibiu o consumo de informação por outras fontes, o que poderia ter fornecido a eles uma visão mais plural da sociedade em que vivem.

    Ao mesmo tempo, preparou terreno para insurreição ao vender a seus seguidores mais radicais que urnas eletrônicas eram fraudadas, pesquisas manipuladas e até inserções de rádios foram roubadas. Ensinou como aceitar em teorias da conspiração por irem ao encontro das "verdades" que ele fomentou.

    Agora, bem treinados, terão muita utilidade em 2023, podendo ser enviados por ele à rua para emparedar o governo diante de mentiras.

    Mas se o comportamento golpista diante da derrota para Lula é uma demonstração de força da extrema direita, também mostra ao restante da sociedade a verdadeira face desse grupo - que atropelaria a democracia se pudesse e, depois, ainda daria ré para passar por cima dela uma segunda vez. Para muita gente, eles deixaram de ser "patriotas" e passaram a ser vistos como "golpistas" e "intolerantes".

    Acompanho grupos de eleitores de Bolsonaro no WhatsApp e tão logo a bandeira do golpe foi hasteada, um intenso conflito foi gerado neles. Pois uma minoria estridente e antidemocrática tentou, sem sucesso, convencer os outros que deveriam exigir que os militares saíssem às ruas. Ouviram como resposta que as eleições haviam acabado e, mesmo que seu candidato tenha perdido, eles não querem confusão.

    Esse eleitor de Bolsonaro que não concorda com violência e não deseja quebra institucional vai desempenhar um papel importante a partir do ano que vem. Eles são as pessoas que não votaram em Lula, mas preferem um governo do petista a um regime imposto pela força. Não podem ser tratados como golpistas e precisam ser acolhidos pelos democratas - sob o risco de serem convencidos pelos golpistas.

    Esses sim não podem ter tolerados em sua intolerância sob o risco de a intolerância vir, em algum momento, destruir a tolerância.

    As instituições precisam desde já punir quem está financiamento os bloqueios de caminhoneiros (sim, eles contam com empresários com recursos) e identificar quem são as lideranças que incentivam os atos golpistas em frente aos quartéis. E leva-los à Justiça - afinal, quem conspira contra a democracia não pode ficar solto por aí.

    Não se trata apenas de acalmar os ânimos após a eleição, mas garantir que o país não seja um campo de batalha dominado pela mentira e o ódio a partir de 2023.

    UOL

     

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