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  • O BRASIL EH O QUE ME ENVENENA MAS EH O QUE ME CURA (LUIZ ANTONIO SIMAS)

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    Fragmentos de textos e imagens catadas nesta tela, capturadas desta web, varridas de jornais, revistas, livros, sons, filtradas pelos olhos e ouvidos e escorrendo pelos dedos para serem derramadas sobre as teclas... e viverem eterna e instanta neamente num logradouro digital. Desagua douro de pensa mentos.


    sábado, agosto 05, 2023

    Vanguardeiros do avanço

     



    LUIZ GONZAGA BELLUZZO

    Inspirou-me, ainda uma vez, o edito-
    rial da Folha de S.Paulo intitulado “A
    Vanguarda do Atraso”. A peça opi-
    nativa condena a mobilização do BNDES
    em direção ao financiamento das empre-
    sas brasileiras, porventura empenhadas
    em empreendimentos no exterior.
    Com argumentos do mesmo jaez,
    e s s e s Va ng u a r dei r os do Av a nç o
    contribuíram para a montagem do sólido
    arranjo conservador que avassalou o País
    na Era Temer-Bolsonaro. Em sua cami-
    nhada produziram o “encolhimento” da
    economia brasileira. Destruíram empre-
    sas, amofinaram a indústria, tudo em no-
    me da modernidade e da globalização. Os
    resultados todos sabem: o desemprego, a
    deterioração das grandes cidades, a vio-
    lência, que não para de aumentar.

     
    As mudanças na composição da rique-
    za explicam a combinação entre as polí-
    ticas econômicas de austeridade e a sa-
    nha das privatizações de bens públicos,
    sobretudo empresas estratégicas para o
    crescimento, tais como a Eletrobras. O
    privatismo à brasileira é irmão gêmeo
    do rentismo que exercita seus propósitos
    ao extrair valor de um ativo já existente
    e gerador de renda monopolista, criado
    com dinheiro público. A onda de privati-
    zações obedece à lógica patrimonialista e
    rentista do capital financeiro, em seu fu-
    ror de aquisições de ativos já existentes.
    Nada tem a ver com a qualidade dos ser-
    viços prestados, mesmo porque os exem-
    plos são péssimos. Em geral, no mundo,
    a qualidade dos serviços prestados pelas
    empresas privatizadas declinou, acom-
    panhando o aumento de tarifas e a dete-
    rioração dos trabalhos de manutenção.

     
    A cumeeira da obra foi, sem dúvida,
    construída com o material produzido
    nas linhas de desmontagem do liberalis-
    mo das cavernas, que impôs juros de agio-
    ta, imobilizou as políticas fiscal e mone-
    tária, sufocando a capacidade de cresci-
    mento. A isto os profetas da turbulência
    permanente, os porta-vozes do “merca-
    dismo”, chamaram de ajuste. A despeito
    do notório fracasso, os Vanguardeiros do
    Avanço pedem a manutenção do roteiro.
    Mas quem é esperto já sabe: tocar a eco-
    nomia no diapasão da dupla Temer-Bolso-
    naro é comprar a receita para o desastre.

     
    Daí a satanização do governo Lula e
    de suas propostas de política econômica.
    Diante do despotismo e da cegueira, ine-
    rentes aos mercados da riqueza, o proble-
    ma não é mais o de arriscar o mandato ao
    tratar de questões econômicas, mas sim o
    de ganhar, mas, na prática, não levar.

     
    É preciso ter claro que a tendência
    marcante do nosso tempo é a crescente
    separação entre o poder e a política: o
    verdadeiro poder, capaz de determinar
    a extensão das opções práticas, flui e,
    graças à sua mobilidade cada vez menos
    restringida, tornou-se virtualmente
    global, ou melhor, extraterritorial.

     
    É o caso da famosa “mão invisível”
    celebrada pelos liberais e encarnada no
    capital financeiro. Os critérios da ação po-
    lítica racional, democrática e libertado-
    ra, não se aplicam à agenda criada pelas
    forças desses mercados em que circula e
    é avaliada a riqueza mobiliária. Tais for-
    ças não são racionais nem irracionais,
    simplesmente cumprem os desígnios de
    sua natureza, dilacerada entre a “ganân-
    cia infecciosa” e o colapso da histamina.

     
    Diante dessa configuração do poder, a
    esfera pública tornou-se prisioneira nos
    palácios de governantes reféns da opaci-
    dade da informação gerada nas grandes
    empresas de mídia. Para a vida privada
    sobrou o narcisismo e o voyeurismo dos
    reality shows.

     
    Esses processos visíveis e simultâneos
    de crescente inacessibilidade do “públi-
    co” e de espetacularização do “privado”
    decorrem da sociabilidade peculiar im-
    posta pelo movimento “invisível” da mão
    que guia o curso dos mercados, em sua al-
    ternância de euforia e timidez.

     
    “Não há alternativa”, proclamam os
    adeptos do neoliberalismo. Sobre esse
    pano de fundo Margaret Thatcher foi
    capaz de anunciar a morte da sociedade
    e o triunfo do indivíduo.

     
    É duvidoso que o indivíduo projetado
    pelo Iluminismo tenha, de fato, triunfado.
    Triunfaram, sim, a insegurança e a impo-
    tência. Tal sensação de insegurança é o re-
    sultado da invasão, em todas as esferas da
    vida, das normas da mercantilização e da
    concorrência, como critérios dominantes
    da integração e do reconhecimento social.
    Nos países em que os sistemas de proteção
    contra os frequentes “acidentes” ou falhas
    do mercado são parciais ou estão em fran-
    ca regressão, a insegurança assume for-
    mas ameaçadoras para o convívio social.

    CARTA CAPITAL


     

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