O crime compensa
"Valena Jacob, pesquisadora e coorde-
nadora da Clínica de Combate ao Traba-
lho Escravo da UFPA, observa que a le-
gislação brasileira contra o trabalho es-
cravo é robusta e reconhecida mundial-
mente, mas os magistrados relutam em
punir os escravocratas. “Quem é o juiz
que está no Justiça do Trabalho e na Jus-
tiça Federal? Tem algum homem preto
ou mulher preta por ali? A esmagadora
maioria é composta de brancos, de classe
média alta. Vemos um Judiciário muito
distante da realidade brasileira”, lamen-
ta. A advogada destaca ainda que muitas
das sentenças são favoráveis aos infrato-
res porque os juízes nem sempre enten-
dem que o trabalho degradante pode ser
classificado como análogo ao de escravo.
“O trabalhador está num barracão de
lona, no meio da mata, sujeito a todas as
intempéries e a animais peçonhentos.
Ele está bebendo água imunda do córre-
go, fazendo alimentação com essa água
sem nenhuma higiene, faz suas neces-
sidades no mato, é tratado como bicho.
Não está em condição análoga à escravi-
dão?”, indaga Jacob. “Por incrível que pa-
reça, alguns juízes acham que não, por-
que eles já viviam em situação de misé-
ria antes, sem banheiro em casa, bebendo
água do córrego. Logo, os empregadores,
os fazendeiros e os grandes proprietários
não poderiam ser responsabilizados.”
Um terço dos indiciados pelo artigo
149 nem sequer vai a julgamento e so-
mente 6,3% dos réus são condenados
definitivamente, revela uma pesqui-
sa da Clínica de Trabalho Escravo da
UFMG. Pior, apenas 1% dos acusados
é sentenciado a mais de quatro anos de
prisão e cumpre pena em regime fecha-
do. Quando a pena é inferior a esse pe-
ríodo, o condenado migra para o regi-
me semiaberto e pode pleitear a pres-
tação de serviços comunitários."
leia reportagem de FABIOLA MENDONÇA