Mais do que a corrupção, o que impressiona é a chinelagem
João Luis Jr
Uma coisa que ficou estabelecida bem cedo durante o governo Bolsonaro é que estávamos diante de uma espécie de Polishop da corrupção, em que todo e qualquer escândalo seria seguido de um “e não é só isso!” com diversas outras pilantragens de brinde.
Sejam as rachadinhas e os funcionários fantasmas, seja o Queiroz, seja a Wal do Açaí, sejam os pastores que recebiam barras de ouro, que como o Sílvio Santos sempre reforçava, valem mais do que dinheiro, tivemos quatro intensos anos em que não apenas tudo que poderia ser feito em termos de picaretagem foi realizado, como descobrimos várias outras modalidades criminosas que colocam a gestão do capitão da reserva como uma espécie de NASA da ilegalidade, levando a tecnologia da corrupção além dos limites imaginados pelo homem.
Mas tão impressionante quanto o escopo desses golpes - quase 4 bilhões de orçamento secreto, 700 milhões em superfaturamento de ônibus, 51 imóveis comprados com dinheiro vivo – é o nível de absoluta, total e completa chinelagem, amadorismo e descaramento de grande parte dessas ações, realizadas com níveis elevadíssimos de descaso e uma falta de qualquer esforço para acobertar ou disfarçar as próprias más intenções, que faz os milicianos que batizaram a própria organização de “Escritório do crime” parecerem discretíssimos.
Um bom exemplo disso é a mais recente denúncia de que Bolsonaro teria tentado entrar no país com mais de 16 milhões em jóias, supostamente presenteadas pelo governo da Arábia Saudita, usando a tática de colocar tudo na mochila de um assessor e mandar ele dizer pra Receita Federal que não tinha nada a declarar. Plano colegialmente brilhante – quem nunca colocou uma pedra dentro da mochila do colega? – que só não deu certo porque, bem, o pessoal da Receita Federal não necessariamente acredita na palavra da gente na hora de liberar nossa entrada no país e um raio-x acusou a presença das jóias na bagagem.
Mas não bastasse o constrangimento de ser o primeiro presidente flagrado tentando contrabandear mercadorias pra dentro do Brasil, Bolsonaro fez questão de mobilizar 3 diferentes ministérios - Economia, Minas e Energia e Relações Exteriores - além do Itamaraty, para tentar liberar as jóias sem pagamento de impostos, só sendo impedido porque os fiscais da receita, que tem estabilidade e não podem ser demitidos, não se intimidaram diante da pressão, mesmo quando ela veio de instâncias superiores
Ou seja, não basta tentar cometer um crime e ser flagrado, é preciso mobilizar o máximo de poder público possível em novas tentativas de concretizar a pataquada, gerando o máximo de trilha de papel que você conseguir, pra ninguém ter dúvida de que sim, você tentou entrar com coisas ilegalmente no país, não, você não quer pagar os impostos e claro, você continuou insistindo na ideia.
Quando você soma isso a outros fatos mais ou menos recentes, como as carpas do planalto que morreram porque alguém esvaziou o espelho d’água pra pegar as moedinhas que jogavam lá ou as emas que faleceram porque não estavam recebendo a alimentação adequada e sim restos de comida como se fossem cachorros de sítio, além de situações estranhamente específicas como sigilo de 100 anos em conversas com Ronaldinho Gaúcho, e você tem um cenário em que a desfaçatez e o descaramento foram tais que daqui a muitos anos ainda vamos estar descobrindo coisas absurdas que esse governo fez.
Porque ainda que os danos causados tenham sido imensos, ainda que as táticas usadas mereçam ser estudadas, ainda que representem um perigo que ainda vai nos rondar por bastante tempo, é preciso ter a perspectiva histórica de lembrar dos homens que comandaram o Brasil nos últimos 4 anos como eles realmente são: bandidinhos pequenos e patéticos, que mesmo com acesso aos recursos de um país imenso, jamais deixaram de ter o “mindset” de quem rouba carne da marmita alheia na copa da firma e tenta aplicar golpe do pix em idoso pelo celular. Quase perdemos pra essa galera duas vezes? Sim, claro. Mas aí também pode ter sido mais vacilo nosso que qualidade deles, vamos refletir.
CONFORME SOLICITADO
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