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  • O BRASIL EH O QUE ME ENVENENA MAS EH O QUE ME CURA (LUIZ ANTONIO SIMAS)

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    Fragmentos de textos e imagens catadas nesta tela, capturadas desta web, varridas de jornais, revistas, livros, sons, filtradas pelos olhos e ouvidos e escorrendo pelos dedos para serem derramadas sobre as teclas... e viverem eterna e instanta neamente num logradouro digital. Desagua douro de pensa mentos.


    segunda-feira, março 06, 2023

    Navegando sem bússola

     

     
     Para que monitorar os níveis de popularidade e avaliação positiva de um candidato se, na hora de votar, os eleitores vão ignorá-los?.
    Marcos Coimbra.
     Saímos da eleição perplexos, com a
    sensação de não entender o País.
    O Brasil havia se tornado incom-
    preensível, com uma sociedade e uma
    vida política inexplicáveis. Nos dois pri-
    meiros meses de 2023, as coisas piora-
    ram. Nem tanto pelo que vimos em 8
    de janeiro, mas pelo que não vimos. Al-
    guns dias depois da irrupção de toda
    aquela estupidez estávamos de volta à
    “normalidade” dos últimos anos. Nem
    sequer uma Comissão Parlamentar de
    Inquérito foi instalada para manter em
    pauta a discussão. A mesma que não foi
    criada para apurar a responsabilida-
    de pelo massacre do povo Yanomâmi,
    uma oportunidade de nos fazer pen-
    sar no país que queremos ser. Através
    dos dois silêncios, é como se reconhe-
    cêssemos que estamos onde a eleição
    mostrou, à beira da barbárie, sempre
    em risco de nos perder por dentro dela.
     
    Está claro que o mais assustador no
    resultado do pleito foi a quantidade e a
    distribuição dos votos que o capitão re-
    cebeu. Quase a metade do eleitorado o
    preferiu, sendo majoritária na parte
    mais rica e desenvolvida do País. Con-
    siderando quem é Bolsonaro, sua tra-
    jetória política e o que foram os quatro
    anos em que esteve à frente do governo, a
    eleição brasileira foi mais surpreenden-
    te do que qualquer outra no mundo de
    hoje. Por piores que sejam personagens
    como Donald Trump, Boris Johnson e
    Narendra Modi, para ficar apenas nos
    principais expoentes da direita inter-
    nacional, nenhum é tão ruim, no plano
    moral e intelectual, tão incompetente e
    cafajeste quanto o brasileiro. Para pio-
    rar, alguém que se apresentou como can-
    didato de si mesmo, enquanto os outros
    disputaram eleições como representan-
    tes de grandes e tradicionais partidos.
     
    O voto dado a Bolsonaro é a radicali-
    zação de um modo de votar no qual são
    irrelevantes a biografia, os atributos e o
    desempenho dos candidatos. Ao contrá-
    rio do que ensina o bê-á-bá da política e
    do consagrado no senso comum, metade
    do eleitorado brasileiro escolheu um re-
    presentante sabidamente desqualifica-
    do e incapaz de realizar uma administra-
    ção adequada, como o capitão demostrou
    ao longo do período em que esteve senta-
    do na cadeira de presidente. Se escolhê-
    -lo podia ser desculpado em 2018, foi ir-
    racional insistir em seu nome na eleição
    seguinte ou preferi-lo a qualquer outro.
     
    A irracionalidade que vimos na elei-
    ção, expressa no vasto contingente que
    mostrou querer a continuidade do que
    sabia ser um governo medíocre ou mau
    (precariamente justificado por seus elei-
    tores mediante desculpas como a pande-
    mia e a “perseguição” que teria sofrido
    das “elites”), é um problema complica-
    do para Lula. Desde quando resolveu
    ser candidato, o presidente apostou que
    recuperaria o lugar que merecia na opi-
    nião pública, a aprovação e avaliação po-
    sitiva que tinha antes de sofrer o ataque
    sem tréguas desfechado contra ele e o PT,
    capitaneado pela indústria da comuni-
    cação, que o levou à prisão. Estava con-
    vencido de que conseguiria voltar a fa-
    zer um bom governo, capaz de melhorar a
    vida das pessoas, especialmente as mais
    necessitadas. Trabalharia com gente de
    bem, tinha boas propostas e imaginava
    que seria julgado na comparação com o
    caos herdado da gangue que saía.
     
    É certo que seus eleitores irão apro-
    vá-lo, mas é incerto que o eleitorado do
    capitão consiga (ou queira) ver algum
    avanço no volume e na qualidade da
    ação do governo. Ao contrário, é possí-
    vel que considere que tudo está igual (se-
    não pior) e que eventuais melhoras re-
    sultem da “herança bendita” do anteces-
    sor. De um lado, dado o estado calamito-
    so em que Lula recebeu o governo, am-
    pliou-se o prazo para que mudanças po-
    sitivas sejam perceptíveis. De outro, não
    há motivo para confiar na racionalidade
    de quem se mostrou tão pouco racional.
     
    Não foi apenas no Brasil que o con-
    ceito de aprovação do governo perdeu
    relevância na vida política, como vi-
    mos em eleições recentes mundo afo-
    ra. Se quase a metade do eleitorado vo-
    tou em um candidato que havia se re-
    velado um presidente ruim ou péssimo,
    que importância tem o desempenho ob-
    jetivo de um governante como critério
    de escolha eleitoral? Para que monito-
    rar seus níveis de popularidade e ava-
    liação positiva se, na hora de votar, os
    eleitores vão ignorá-los?
     
    No ano que vem, teremos eleições para
    prefeito e vereador e, em mais três, elei-
    ções gerais. Fora verdades banais e ob-
    viedades, ninguém sabe o que o Brasil
    pensa e como chegaremos a elas. Só sa-
    bemos que (quase) tudo que consideráva-
    mos conhecido está posto em dúvida
     
    CARTA CAPITAL 
     
     

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