Os melhores três minutos da Copa do Mundo
Martín Fernandez
Três minutos. Mais ou menos entre 23h25 e 23h28, horário de Doha, o mundo inteiro prendeu a respiração, tomado de admiração, espanto, assombro, maravilhamento, estupefação, a lista poderia continuar até o fim desta coluna. Durante três minutos a Copa do Mundo de 2022 ofereceu uma janela para outro universo, diferente, inesperado, novo, provavelmente mais divertido: um mundo em que Costa Rica e Japão eliminavam Alemanha e Espanha na fase de grupos, uma versão ainda mais extrema do que o Brasil teve privilégio de hospedar em 2014, quando Uruguai e Costa Rica (lá vêm eles de novo!) impediram Itália e Inglaterra de avançarem às oitavas.
Graças a uma exótica combinação de resultados, os dois duelos finais do Grupo E da Copa funcionaram como mata-matas paralelos — ou cruzados. A Alemanha enfrentava a Costa Rica no Estádio Al Bayt, mas seu verdadeiro rival era o Japão, que enfrentava a Espanha simultaneamente no Estádio Khalifa, 50 quilômetros ao sul. E o pesadelo da Espanha era a Costa Rica. As quatro seleções chegaram à última rodada com chance de classificação e risco de eliminação. Uma prova definitiva da beleza deste formato de Copa do Mundo, com 32 times, divididos em oito grupos de quatro, em que dois avançam e dois caem.
Durante os primeiros 45 minutos protocolares dos dois jogos, os campeões mundiais fizeram cada um a sua parte. Alemanha e Espanha venciam seus jogos por 1 a 0, e educadamente escoltavam os pequenos até o aeroporto. O segundo tempo começou com uma tempestade no deserto. Primeiro, o Japão virou sobre a Espanha — resultado que eliminaria a Alemanha. Em seguida, os jogadores da Costa Rica descobriram que também lhes era permitido atacar e fizeram dois gols na Alemanha como fruto de pura imposição física. Só na Copa do Mundo o estelar Manuel Neuer, um dos maiores goleiros da história, lenda do Bayern de Munique, pode ser vencido por Yeltsin Tejeda, um jogador 20 centímetros mais baixo, funcionário do Club Sport Herediano e seu estádio de 8.700 lugares.
Durou três minutos este par de resultados inesperados, as duas derrotas por 2 a 1 que redefiniriam o mapa e o futuro do futebol mundial. Durante três minutos o Al Bayt deixou de ser uma tenda silenciosa erguida sem nenhum motivo razoável no meio do deserto do Catar para se transformar numa festa de todo mundo que não fosse alemão. Os telões do estádio exibiram a classificação temporária do grupo: Japão e Costa Rica classificados, Alemanha e Espanha eliminadas. E então, exatos três minutos depois, Kai Havertz empatou o jogo, acabou com as chances da Costa Rica e salvou a Espanha —que não faria o menor esforço para derrotar o Japão e retribuir o favor. Os alemães ainda fizeram mais dois gols apenas para confirmar este jogo como um pacto suicida. Gols totalmente inúteis. As vagas seriam de Espanha e Japão, distantes 50 quilômetros no mapa, mas a uma distância inalcançável para Costa Rica e Alemanha.
Uma jornada frustrante para uma potência do futebol que veio ao Catar para tentar apagar o vexame de 2018. Uma jornada perfeita para o mundo inteiro desfrutar dessa maravilha chamada Copa do Mundo. Ainda que por apenas três minutos.
GLOBO