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  • O BRASIL EH O QUE ME ENVENENA MAS EH O QUE ME CURA (LUIZ ANTONIO SIMAS)

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    Fragmentos de textos e imagens catadas nesta tela, capturadas desta web, varridas de jornais, revistas, livros, sons, filtradas pelos olhos e ouvidos e escorrendo pelos dedos para serem derramadas sobre as teclas... e viverem eterna e instanta neamente num logradouro digital. Desagua douro de pensa mentos.


    segunda-feira, junho 06, 2022

    Ciro Gomes nao consegue esconder o ressentimento

     


    ESTHER SOLANO

    Ah, Ciro, Ciro, como é um espe-

     táculo triste ver alguém se sui-
    cidar politicamente ao vivo e
    em cores. Mais triste ainda é essa mor -
    te ser evidente para quem olha de fora,
    atônito ao necroespetáculo, e não con -
    siga ser percebida pelo próprio defunto.
    Sempre considerei Ciro um sujeito in-
    teligente, ou, talvez deveria dizer, um su-
    jeito de conhecimento. A inteligência é
    um poliedro, tem aquela inteligência que
    acumula conhecimento, aquela afetiva,
    aquela relacional, tantas. São inteligên-
    cias das mais variadas morfologias, das
    mais variadas sensibilidades, mas todas
    relevantes. Possuir conhecimento sem
    uma inteligência afetiva e relacional que
    organize socialmente esses saberes, que
    dê consciência do lugar no mundo, do es-
    paço, do momento, da própria significân-
    cia ou insignificância, enfim, sem uma
    inteligência estratégica, sem uma inte-
    ligência dialógica, uma inteligência polí-
    tica, é uma assimetria que na vida públi-
    ca custa caro. Talvez o poliedro de inte-
    ligências de Ciro, em algum momento de
    sua biografia, tenha sido mais equilibra-
    do, mais proporcional, refletia luzes de
    vários ângulos. Não mais. Agora, quando
    olho para eles, vejo muitos vácuos, mui-
    tas sombras, muitos cinzas.

     
    Escuto Ciro falando e escuto um ho-
    mem ressentido. E não é que o ressenti-
    mento por si só seja intrinsecamente ma-
    lévolo e abjeto, mas, quando o ressenti-
    mento vira uma das forças motrizes da vi-
    da, quando vira oxigênio, alimento, moti-
    vação... aí lascou. Ressentido por que, eu
    me pergunto? Ressentido com quem? Pa-
    rece-me que há duas origens do ressen-
    timento, Lula e nós, o povo. Ciristas po-
    derão tentar me contradizer, mas um ho-
    mem é escravo de suas palavras e, nossa,
    como Ciro é escravo das suas. Quando fa-
    la de Bolsonaro, fala com desprezo, como
    de fato se fala a respeito de um ser abomi-
    nável, mas, quando fala de Lula, fala com
    ressentimento, fala do ponto da cicatriz,
    fala do lugar da mágoa, uma mágoa que se
    faz ostensiva, que aparece como um pa-
    vão ao esticar as penas. É evidente. Não
    sei se tentou esconder ou se ensina com
    orgulho, mas a cicatriz sempre aparece.

     
    Lula roubou o grande papel que a
    história lhe reservava. Essa é a cicatriz.
    Obviamente, ele vai negar, os ciristas ne-
    garão, mas a cicatriz fala por ele, porque a
    cicatriz de Ciro é força motriz. E, amigos,
    cá entre nós, a gente sabe muito bem que o
    discurso da corrupção perdeu a originali-
    dade. Não só Lula roubou de Ciro seu des-
    tino messiânico, como o povo continua a
    lhe roubar esse destino. Pois só Ciro tem a
    resposta, só Ciro pode tirar o País do caos,
    só Ciro tem um plano, porque, como dis-
    se no embate com Gregório Duvivier:
    “Se Deus me der a ventura de proteger o
    Brasil”. Temo que Deus esteja em outra,
    Ciro. Nem estava com Bolsonaro, nem
    parece estar com você. Eu o encontro no
    padre Júlio Lancellotti, cuidador de outro
    tipo de cicatrizes, umas muito diferentes
    das suas. Mas é isso. A chance de umBrasil
    “fodástico” está na nossa frente e o brasi-
    leiro não enxerga. Como o povo é burro e
    prefere Lula?

     
    Ah, Cirão das massas... na real, tirem o
    “das massas”, porque pega um pouco mal
    se autodenominar das massas com 7% de
    intenções de voto. Ah, mas pesquisa é só a
    radiografia do momento, não dá para cra-
    var nada. Não dá para cravar tudo, mas
    um pouquinho dá, né? E o que dá para cra-
    var mesmo é que 7% não é a massa e que
    48% é bastante mais massa.

     
    Algo que detesto é a arrogância mani-
    festa, escancarada. A arrogância daquele
    que não sabe debater a não ser diminuindo
    seu interlocutor, pois ele sabe mais, estu-
    dou nos EUA, ou o outro é jovem, inexpe-
    riente, ou comediante... Talvez porque, co-
    mo mulher, eu tenha me deparado tantas
    e tantas vezes com homens que, em vez de
    falar, pontificavam, cuspiam dogmas de
    suas bocas, tentavam me vilipendiar in-
    telectualmente. Talvez seja porque, como
    mulher, veja tantas e tantas colegas bri-
    lhantes a falar baixinho, sem se apropriar
    de seu brilhantismo e se apagando na fren-
    te do ego masculino. E isso dói, como dói.
    Então, Ciro, se você for de fato o envia-
    do de Deus, por que não consegue con-
    vencer o povo? Se Bolsonaro só oferece
    terror e Lula só oferece corrupção, de-
    veria ser muito mais fácil ganhar a con-
    fiança dos eleitores, não é? Por que suas
    “massas” não passam de 7% a 48%? O po-
    vo é tão burro assim?

     
    Cansada, cansada das carteiradas dos
    homens brancos. Cansada de ver o res-
    sentimento se impor. Cansada desse an-
    tipetismo mórbido. No embate com Gre-
    gório Duvivier, Ciro disse uma frase que
    não perdoo, “bolsonaristas e lulistas são
    a mesma coisa”.

     
    Nesse momento Ciro expulsou a pu-
    rulência de sua cicatriz pela boca. E, no
    fundo, entendi o que ele queria falar. São
    a mesma coisa porque são “as massas dos
    outros”, porque a dele só chega a 7%.
    A gente se vê em outubro, Ciro. Desta
    vez vai para onde, Dubai?  

     

    CARTA CAPITAL  

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