A Pedrada do Reino
Fiquei triste com a exibição da mini-série A Pedra do Reino.
Muito esforço das pessoas, muito dinheiro investido, a coisa interessante de se envolver e incentivar os artesõe locais de Taperoá & artistas ligados a grupos folclóricos,
dando nesse resultado hermético
e herético ( no mau sentido) em relação ao universo suassunesco.
Me entristeceu a perda de excelente oportunidade para levar num veículo de massa doses maciças de cultura brasileira para a massa brasileira
ou mesmo - como pretendia Luiz Fernando Carvalho em seus discursos - atiçar o olhar dos telespectadores, cutucá-los em formas diversas de pensar e apreender.
A questão foi o excesso. Isso nao está sendo uma cutucada, está sendo um chega pra lá.
Reforça o preconceito de que arte é uma coisa chata.
E triste fiquei também com a transformação de um livro genial, que seria de grande interesse e impacto se fosse mais Ariano e não uma ego trip de LFC.
Um delírio glauberiano.
(Aliás, as tomadas de cameras rodando diante de um ser gritando em alto de montanhas & platôs são totalmente Gláuber).
Gláuber podia ser genial mas era chato.
Esta adaptação da Pedra do Reino é apenas chato.
O primeiro capítulo (aquele que deveria seduzir o espectador) foi incompreensível (e para mim, que conheço a história, que tenho costume de saltos & acrobacias narrativos). Para o telespectador em geral, taí o ibope caindo de 23 para nove no decorrer do programa.
E olha que a Globo finalmente se dispôs a mexer na grade pra colocar mais cedo uma coisa diferente! (outra lástima, quem sabe a emissora nao faz mais isso..)
O romance "A Pedra do Reino" é imensamente rico. Os cenários, figurinos, a atuação dos atores, vê-se que são de riqueza. Daria para produzir obras excelentes, mesmo que não lineares, mesmo que criadas em cima desse universo. Justamente: criadas sobre o universo e não em dissonância ao universo.
LFC, claro, pode veicular sua versão do livro (embora eu considere que esteja no veículo errado, as telas pequenas de TV - ainda maioria neste país - são pequenas para tanta movimentação e exageros e overactings). Mas não deveria então ser alardeado como "A-Pedra-do-Reino-de-Ariano-Suassuna" - em meios às comemorações de seus 80 anos - e sim como "LFC recria A Pedra do Reino". Claro que isto não é um título, mas acho que vocês entenderam o ponto, não?
Na música clássica compositores recriam obras de outros compositores mas as novas versões passam a ser creditadas como "variações de Fulano sobre um tema de Sicrano" ou coisa assim. Aliás, o exemplo musical é útil para o que digo: fez-se no caso da mini-série um remix.
Que soa como aqueles remixes onde se perde a música original e vira algo mais do mixador do que do autor.
Por falar em música: vou fazer uma reclamação bem suassuna - o musicário brasileiro é muito rico e totalmente apropriado aos temas da série. Por que enfiar na trilha Kronos Quartet, Tersipchore Ensemble, Gogol Bordello e que tais? Para se mostrar espertinho? Para enfatizar o universalismo do regional? Por ser o que LFC gosta?
O resultado todo parece ser isso: o que LFC gosta. Seu gosto, suas preferencias, acima do material a ser trabalhado.
Não há obrigação de adaptações serem fiéis. Mas se for para radicalizar, liquidificar, cara, tem que ser feito com muito talento. E não dá para errar a mão desse jeito. Um pouco de contensão e concisão não fariam mal a essa radicalidade. Ainda mais com o discurso do diretor a respeito das finalidades "educativas" do projeto.
Os alunos não prestaram atenção.
Delirou-se aqui mais do que o delírio do Quaderna.
Delirou-se como os intelectuais deliraram nos anos 60 achando que estavam ensinando ao povo o caminho do seu futuro - só que esqueceram de combinar isso com o povo.
leia também a opinião de quem destrinchou a fundo o livro, no Leite de Pato