SONHOS
Quando saí para o exilio deixei em diversos sebos de Santa Teresa minhas coisas, as revistas, os livros, os discos, alguma papelada.
O sonho consistia em percorrer esses lugares desse bairro antigo do Rio, as livrarias, os restaurantes que vendem quinquilharias nos fundos, casas de pessoas
anos depois
ao retornar
tentando recuperar esses pedacinhos de minha vida
do passado
conferindo e levantando se ainda restava algo
que nao fora vendido ou jogado fora
minha coleção de Grilo, os discos dos anos 50 que Raul Seixas me deu, a coleção argonauta de ficção científica, rolling stones dos anos 60 falando de hippies e psicodelismo, bootlegs de Dylan, fitas cassetes que gravei de shows clandestinos contra a ditadura militar, paperbacks com toda a obra de Jack Kerouac... etc
(objetos que tenho inclusive na vida real - tudo em caixas em paquetá).
Foi um desses sonhos meticulosos e chatos e demorados que se arrastam enquanto eu revia objetos e lugares. Fiz um levantamento em folhas de papel e me lembro de no sonho estar escrevendo cada ítem e o estado em que se encontrava.
Depois fui percorrendo esses lugares que ai pareciam Ouro Preto e fazia muito frio e eu negociava a compra ou a devolução das coisas que eram minhas e que espalhei ao ter que partir e às vezes eram outras pessoas e não faziam idéia de nada e às vezes eram as mesmas mas não se lembravam
eu era mendigo e maltrapilho e um estranho e cheguei a pensar que eu era um fantasma
voltando de um passado que nao existia mais ou que nunca existiu,
Hoje é dia de feira e nem clareia o dia quando o barulho dos feirantes chegando me acorda.