Possível inflexão de Trump é vista com cautela no governo brasileiro, que não descarta um blefe
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Interlocutores do governo brasileiro veem com cautela o que poderia ser
uma inflexão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao
declarar que pretende conversar, em algum momento, com o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva. Na avaliação de diplomatas ouvidos pelo GLOBO,
dado seu histórico d voltar atrás em situações anteriores, Trump pode
estar blefando.Em entrevista a jornalistas antes de embarcar para o Texas, Trump
voltou a defender o ex-presidente Jair Bolsonaro. Mas trouxe como novo
elemento a possibilidade de falar com Lula.
— Talvez eu fale com o Lula em algum momento. Vamos ver o que acontece — disse, sem dar detalhes.
Um dia antes, na noite de quinta-feira, Lula disse que não teria qualquer problema em conversar com Trump, em entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo.
— Na hora que houver necessidade de conversar com o Trump, eu não terei nenhum problema de ligar para ele, como eu já liguei para o (Bill) Clinton, já liguei para o (George) Bush, já liguei para o (Barack) Obama, já liguei para o (Joe) Biden. Agora, é preciso ter uma razão para ligar, dois presidentes não ligam para contar piada — disse Lula.
Em momentos diferentes, portanto, ao responderem a perguntas específicas, Trump e Lula sinalizaram que podem romper o silêncio. Porém, de acordo com integrantes do governo brasileiro, o essencial é saber se a equipe do Escritório de Comércio da Casa Branca (USTR), receberá instruções para prosseguir ou parar as negociações entre os dois países que ocorrem desde março deste ano .
Até o anúncio da sobretaxa de 50% a todos os produtos brasileiros, técnicos do Brasil e dos EUA negociavam uma saída para dois problemas: a tarifa de 25% sobre aço e alumínio e outra de 10% sobre as compras do Brasil.
A avaliação no governo Lula é que o Brasil recebe um tratamento diferenciado dos demais países atingidos pelo tarifaço de Trump. Além da aplicação de uma sobretaxa de 50% a todos os produtos brasileiros em um cenário de superávit comercial a favor do lado americano, a Casa Branca introduziu um componente de intervenção política inédito na história das relações bilaterais entre os dois países.
Por outro lado, destacam esses interlocutores, Donald Trump também pode estar blefando ao avisar que, a partir de 1º de agosto, entrará em vigor a sobretaxa de 50%. Ao dizer que Bolsonaro está sendo injustiçado pelo Judiciário brasileiro, o presidente americano talvez não imaginasse a forte reação negativa à medida, inclusive entre bolsonaristas.
Os recados dados pelo Brasil nos últimos dias mostram que o governo brasileiro poderá dobrar a aposta. Mais do que uma ação contra o protecionismo de Trump na combalida Organização Mundial do Comércio (OMC), uma possível retaliação concentrada em propriedade intelectual e direito autoral, como patentes de medicamentos, musicais e filmes americanos assusta os EUA.
Nesta sexta-feira, o governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas, reuniu-se com Gabriel Escobar, encarregado de negócios da Embaixada dos EUA em Brasília. A representação está sem embaixador e Escobar é o principal nome do governo americano no Brasil. O tema foi a tarifa de 50%.
"Vamos abrir diálogo com as empresas paulistas, lastreado em dados e argumentos consolidados, para buscar soluções efetivas. É preciso negociar. Narrativas não resolverão o problema. A responsabilidade é de quem governa", escreveu o governador, que é bolsonarista e um dos cotados a serem candidatos à presidência em 2026 como alternativa a Bolsonaro, declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Em nota, a embaixada disse que diplomatas americanos "se reúnem regularmente com governadores brasileiros". Destacou que São Paulo é o estado com a maior concentração de investimento americano no Brasil.
Já o Itamaraty não se manifestou. Alguns diplomatas afirmaram que a ida de Tarcísio à embaixada foi um "jogo de cena", para tentar corrigir algo que os próprios bolsonaristas provocaram.


