Filme lembra chefe da reforma agrária do governo Jango em meio aos 60 anos do golpe
NAIEF HADDAD
Em meio à efeméride dos 60 anos do golpe militar, muito se fala sobre os principais vitoriosos, como os generais Castello Branco e Costa e Silva, e sobre alguns derrotados, como o presidente deposto João Goulart (PTB), o Jango, e o então deputado federal pelo Rio Grande do Sul Leonel Brizola.
Entre esses últimos, um nome pouco lembrado é o de João Pinheiro Neto (1928-2006), que comandou uma área tida como essencial por Jango, a política agrária, um dos pontos centrais das chamadas reformas de base.
Um novo documentário deve contribuir para tirar Pinheiro Neto do esquecimento. Com direção de Barbara Goulart (neta de Jango) e Caio Bortolotti, “Terra Revolta” tem sessão para convidados no dia 4 de abril no Rio e estreia nos cinemas de São Paulo e do Rio em 2 de maio.
Nascido em uma família de expoentes da política mineira, esse advogado e professor foi assessor de Juscelino Kubitschek (PSD) ao longo dos anos 1950 e teve uma breve passagem como ministro do Trabalho e da Previdência durante o período parlamentarista (1961 e 1962), com Jango como presidente e Tancredo Neves como primeiro-ministro.
A fase mais relevante da sua vida pública veio em seguida, quando, depois de um plebiscito, o Brasil retomou o sistema presidencialista, com Jango no Planalto. De meados de 1963 ao golpe militar, iniciado em 31 de março de 1964, Pinheiro Neto esteve à frente da Supra (Superintendência da Reforma Agrária).
Homem culto e de porte quase aristocrático, nunca foi um extremista de esquerda. Ao seu modo, decidiu enfrentar a desigualdade social.
Entre os entrevistados do filme, estão Maria Thereza Goulart, viúva de Jango, e Almino Affonso, ministro do Trabalho de Goulart em 1963, além de familiares e amigos de Pinheiro Neto.
“De maneira paradoxal, Jango, um proprietário de terras, passou a sustentar a necessidade da reforma agrária como uma das bandeiras do seu governo”, lembra Affonso.
Tanto é assim que, no famoso comício da Central do Brasil, o presidente assinou o “decreto da Supra”, que, em linhas gerais, determinava a desapropriação das terras de mais de 500 hectares localizadas em uma faixa de dez quilômetros à margem de ferrovias e rodovias federais.
Numa entrevista concedida à cineasta Lúcia Murat nos anos 1990, com trechos exibidos em “Terra Revolta”, Pinheiro Neto comentou as incessantes pressões vindas de fazendeiros, mas não só. Muitos empresários e militares também estavam indignados com o “decreto da Supra”.
JK, uma espécie de mentor de Pinheiro Neto, se distanciou do governo Jango neste momento.
Era “uma proposta reformista, modernizadora, que nós jamais saberemos a que teria nos levado”, diz a historiadora Angela de Castro Gomes sobre aquele plano de política agrária.
Com o golpe instalado nos palácios e nas ruas, Pinheiro Neto passou algumas semanas na prisão. Foi a julgamento e, defendido por Sobral Pinto, acabou absolvido. Nunca mais retomou a vida pública.
TERRA REVOLTA – JOÃO PINHEIRO NETO E A REFORMA AGRÁRIA
Quando: sessão para convidados: às 20h do dia 4 de abril (quinta) no Estação Net do shopping Gávea, no Rio de Janeiro; estreia para o público prevista para 2 de maio em São Paulo e no Rio
Produção: Brasil, 2023
Direção: Barbara Goulart e Caio Bortolotti
Duração 73 min.
FOLHA