Fragmentos de textos e imagens catadas nesta tela, capturadas desta web, varridas de jornais, revistas, livros, sons, filtradas pelos olhos e ouvidos e escorrendo pelos dedos para serem derramadas sobre as teclas... e viverem eterna e instanta neamente num logradouro digital.
Desagua douro de pensa mentos.
domingo, dezembro 18, 2022
Messi, em sua última Copa, é quem merece
Marcelo Barreto
Conhece a penúltima, malandro? A voz e o sotaque inconfundíveis de
Manolo Epelbaum ecoavam pelas redações cariocas, que ele visitou com
frequência durante muitos anos. Radicado no Rio desde a década de 50,
Manolo se tornou uma espécie de embaixada jornalística da Argentina na
cidade. Colaborador de jornais e revistas de Buenos Aires, trocava
notícias com os colegas brasileiros. E aproveitava esse contato para
exercer seu maior prazer: contar histórias e anedotas — nunca a última;
daí seu bordão.
Manolito, como gosto de chamá-lo, em homenagem a um dos amigos de
Mafalda, a personagem imortal dos quadrinhos de Quino, não faz mais seu
périplo pelas redações. Por causa da pandemia, passei muito tempo sem
visitá-lo, sem saber a penúltima (que eu invariavelmente conhecia de
cor, de tanto tê-lo ouvido contar, sempre com o mesmo interesse, à
espera do riso gostoso no fim). Mas é nele que vou pensar hoje, quando
Messi entrar em campo para — essa sim — a última partida do maior
jogador desta época numa Copa do Mundo.
Eu nem precisava de um amigo tão querido para me convencer de que a
Argentina merece vencer a final contra a França. Bastava pensar no que
Messi representa e em como será justo se ele se despedir repetindo o
gesto de Maradona, levantando a taça como o herói da Copa. Mbappé, o
outro camisa 10 em campo, já tem um título mundial e vai continuar
jogando por uma seleção poderosa, que tem tudo para chegar como favorita
às próximas edições. O problema é que o futebol não assume compromissos
com merecimento, justiça, essas coisas. Se assumisse, não teria
acontecido o que aconteceu quando faltavam só quatro minutos, e aí o
Manolito ia ter de me desculpar, porque seríamos nós contra eles na
semifinal e...
De volta ao mundo real. Uma vitória da Argentina sobre a França, hoje,
além de consagrar a passagem de Messi pelas Copas do Mundo, devolverá um
pouquinho do equilíbrio perdido, nas ultimas edições, entre América do
Sul e Europa. Donos do dinheiro que move o futebol, os europeus
conquistaram todas as taças desde 2006. O último campeão sul-americano
foi o Brasil, encerrando uma década de domínio, com três finais seguidas
e dois títulos.
Agora, o senso comum diz que o Brasil para na primeira seleção europeia
que enfrenta num jogo eliminatório. É assim desde 2006, e há quem veja
nisso um padrão. Mas se o mesmo raciocínio é aplicado retroativamente,
vemos que a seleção, quando não chegou à final, foi eliminada por um
adversário europeu. Ou pela Argentina, como aconteceu num grupo em 1978 e
num mata-mata em 90.
A Copa, no fim das contas, é Brasil e Argentina contra a Europa (o
Uruguai já esteve do nosso lado e até tem seu protagonismo, mas há muito
não é um verdadeiro candidato ao título). Os países que levam nossos
jogadores para seus clubes são também os que entram no nosso caminho no
futebol de seleções. Então, hoje estou com Messi e Manolito. Não
necessariamente torcendo — palavra forte para um rival, e algo que me
prometi não fazer por mais ninguém nesta Copa depois daqueles quatro
minutos, que drenaram toda a minha energia. Mas achando que o certo é
eles vencerem. Vamo!