Fragmentos de textos e imagens catadas nesta tela, capturadas desta web, varridas de jornais, revistas, livros, sons, filtradas pelos olhos e ouvidos e escorrendo pelos dedos para serem derramadas sobre as teclas... e viverem eterna e instanta neamente num logradouro digital.
Desagua douro de pensa mentos.
domingo, novembro 27, 2022
Enfraquecimento e radicalização do bolsonarismo
MARIA CARLOTTO
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A decisão de ontem do Ministro Alexandre de Moraes, favorável ao pedido
do PP e do Republicanos para serem excluídos da multa de R$22,9
milhões, que agora fica só com o PL, não surpreende.
2/ Independentemente das razões
jurídicas mais ou menos justificadas (e até acho que são justificadas),
politicamente, o efeito é isolar ainda mais os radicais bolsonaristas
que que se concentraram no PL, atraindo o PP e o Republicanos para uma
ala direita mais tradicional.
3/ Essa direita tradicional não tem
propriamente um compromisso inabalável com a democracia, ao contrário.
Porém, neste momento, esses setores entenderam que a eleição de 2022 é
página virada e que não adianta insistir na subversão do resultado.
4/ PP é o Partido de Ciro Nogueira,
que apesar da oposição virulenta que tem feito, inclusive à equipe de
transição de quem é o interlocutor institucional, foi o primeiro nome do
governo a dizer que sim, teria transição.
5/ Mais importante ainda, o PP é o
partido de Arthur Lira, que não só reconheceu imediatamente o resultado
das eleições.em nome da Câmara, como está em plena negociação com o novo
governo. Já anunciou que não vai instalar CPI de abuso de autoridade
alguma.
6/ O Republicanos é o partido de
Tarcísio, que, na transição em São Paulo, está operando para isolar o PL
e os bolsonaristas, chamando Kassab, do PSD, para homem forte do seu
governo.
7/ Tarcísio chegou ao ponto de
fundir secretarias para dar menos espaço para os bolsonaristas no seu
governo, a começar por Ricardo Salles.
8/ Sem me alongar muito, o que eu
depreendo de tudo isso e que PP, Republicanos e PL, que formaram a
coligação de Bolsonaro, vão seguir rumos cada vez mais diferentes daqui
para frente, o que contribui para isolar ainda mais Bolsonaro, pelo
menos institucionalmente.
9/ Quanto mais isolado do sistema
político, mais Bolsonaro vai precisar apostar na mobilização política do
seu núcleo duro. Por isso, a tendência é que o bolsonarismo navegue,
por mais tempo, ondas radicais.
10/ E quanto mais radicais forem
essas ondas, mais a direita articulada no PP e no Republicanos tenderão a
se afastar do bolsonarismo.
11/ Em suma, a intensificação do
movimento bolsonarista em torno de si mesmo, que deve ocorrer daqui para
frente, vai centrifugar forças políticas menos radicais, para fora da
sua órbita de influência o que, acho, deve radicalizá-los ainda mais,
num círculo vicioso de desespero.
12/ A pergunta que fica é: qual será
a forma e o conteúdo dessa radicalização nesse cenário de
enfraquecimento crescente do bolsonarismo? Não me surpreenderei se antes
da metade do próximo ano, muitos estejam presos.
13/ Por um lado, isso é ótimo porque
eles realmente ameaçam a democracia brasileira numa escala inédita. Por
outro, terá como efeito redimir forças que são tão responsáveis pelo
bolsonarismo quanto o próprio Bolsonaro. Dá-lhe conciliação no
horizonte.
Eu fico com advertência de Florestan Fernandes: quando não se rompe com o
passado, este reaparece a cada passo do caminho para cobrar o seu
preço.