Com vocês, o meu ministério dos sonhos
Gregorio Duvivier
Na política externa, tenho sonhado com uma pessoa que acredite em política externa. Não precisa ser um gênio, falar várias línguas, nem sequer ter passado no concurso do Itamaraty. Mas seria legal se fosse uma pessoa agradável. Que não desperte ódio em toda a comunidade internacional. Alguém afável. Que saiba sorrir, e apertar mãos. E não odeie o Brasil.
Me peguei sonhando com um ministro da Saúde que acredite no SUS. Atenção: não precisa ser médico. Basta que vá ao médico. E que acredite que todo o mundo mereça um médico. Idealmente, seria legal que tenha se vacinado. Não sei se estou pedindo demais.
Colagem com uma imagem da protagonista do filme A Noviça Rebelde em que ela está com os braços abertos. Ela veste uma camisa verde e amarela do Brasil. No fundo, há uma foto do Pão de Açúcar na parte superior e faixas roxas na parte inferior.
Na Ciência, podíamos testar uma coisa diferente: alguém que acreditasse na teoria da terra redonda, que conhecesse a palavra (de Darwin), que seguisse as leis (de Newton). Parece exótico, mas não custa nada tentar.
Na Cultura, sonho com uma pessoa que não seja o pior ator que já passou por "Malhação". Ah, também seria legal se ele não fosse abertamente nazista.
Na Economia, sonho com um ser humano. E só. De preferência bastante humano. Se souber fazer conta, melhor. Mas que seja humano e goste de humanos e não tenha prazer em ver humanos passando fome.
Na Educação, tenho sonhado um pouco alto demais. Imagina que beleza um professor. Mas não precisa tanto. Também pode ser um bom aluno. Ou só um aluno. Qualquer aluno. Basta que combata problemas reais, e não imaginários (kit gay, banheiro unissex). Se conseguir que haja merenda pra todos e ninguém desmaie de fome durante a aula, já tá de bom tamanho.
No combate à fome, sonho com alguém. Basta alguém. Não importa a pessoa. Mas que haja uma pessoa pensando nisso. Alguém que reconheça que há fome e acorde pensando nisso e faça alguma coisa, qualquer coisa, em relação a isso.
Na Defesa, sonho com um civil, como nas democracias. E sonho que os generais cuidem do Exército, e os brigadeiros se ocupem da Aeronáutica, e os almirantes se preocupem mais com navios à deriva do que com urnas funcionando. E tenho uma utopia: que se aposentem. E quando isso acontecer, que encontrem hobbies menos danosos que a política. Crochê. Bocha. Swing. Tanto faz.
FOLHA
Ilustração de Catarina Bessell