Se for Jair agora, será Jair pra sempre
Celso Rocha de Barros
A eleição de uma bancada de senadores de extrema direita no dia 2 teve uma grande vantagem: deixou claro o que está em jogo na eleição deste ano. Se Jair Bolsonaro vencer, terá maioria para mudar a Constituição e neutralizar o Supremo Tribunal Federal. Não é mais eleição para presidente. É plebiscito para ditador.
Bolsonaro disse à Veja que um projeto sobre isso "já chegou até ele", mas que só falará dele depois da eleição. Hamilton Mourão já entregou o jogo na GloboNews.
Daí em diante, é o roteiro da Hungria, da Venezuela, de todos os novos autoritários: se você tiver a suprema corte aparelhada, tudo o que você fizer será declarado constitucional, e o golpe raiz, com tanque na rua, se torna desnecessário.
Senado e STF foram as principais salvaguardas da democracia brasileira contra Bolsonaro no primeiro mandato. Se Jair vencer agora, não tem mais nada disso. Ele faz o que quiser.
E vale notar: os senadores extremistas não entraram no lugar de senadores de esquerda. Em 2022, Bolsonaro usou o peso da máquina pública para substituir direitistas tradicionais, de perfil democrático, por extremistas como ele.
O PSDB foi dizimado. Os dois partidos que serviram de escada para Bolsonaro nos debates, PTB e Novo, não conseguiram atingir a cláusula de barreira. Romeu Zema foi o último sobrevivente dos governadores que se elegeram com Bolsonaro em 2018: Jair derrubou Wilson Witzel e fez um tal cerco político a João Doria que ele nem sequer saiu candidato neste ano.
Embora Rodrigo Garcia, por ódio ao PSDB, tenha declarado apoio a Bolsonaro, o extremista Tarcísio de Freitas não o queria no palanque: o bolsonarismo só aceita a sua variedade de direita, e todo aliado da direita moderada será substituído por um radical da quadrilha na primeira oportunidade. O senador Romário foi traído por Bolsonaro poucos dias antes da eleição.
Ou seja, acabou o teatrinho de fingir que Jair Bolsonaro é um candidato normal. Se a direita bancar Jair —e, é bom lembrar, se ela quiser quebrá-lo ao meio, pode fazê-lo em questão de horas—, as instituições brasileiras, as mesmas que foram tão eficazes em forçar a esquerda a moderar seu discurso nas últimas décadas, vão ser castradas.
Daí em diante, ou Bolsonaro implantará seu fascismo, ou, em caso de vitória futura da esquerda, ela tampouco terá quem a contenha.
Afinal, a vitória de Bolsonaro em 2022 quebraria a esquerda moderada. Se nem Geraldo Alckmin como vice de Lula for suficiente para trazer a direita brasileira para a mesa de negociações, o que será?
Esquerdistas moderados como Fernando Haddad, que articulou a aliança com Alckmin, perderão espaço para quem sempre disse —com razão, se Jair vencer— que o diálogo era impossível, que não havia uma centro-direita democrática forte com a qual se aliar.
Muita gente, inclusive eu, está falando sobre o que a esquerda deve fazer. Mas é hora de a direita brasileira tomar a decisão mais importante de sua história moderna: se fechar com Jair, é para aderir incondicionalmente ao golpe e embarcar de vez na radicalização.
Políticos de direita pensando em apoiar Bolsonaro: perguntem aos esquerdistas moderados que apoiaram o Chávez esperando moderá-lo o que eles ganharam com isso. Você não lembra mais o nome de nenhum deles? Pois é.
FOLHA