Por que esse lema 'ordem e progresso' na bandeira?
Deirdre Nansen McCloskey
Ordem e progresso, diz a bandeira de vocês. Sim, eu sei, às vezes parece brincadeira.
O mesmo pode ser dito do nosso lema nos EUA, em latim: E pluribus unum ("de muitos, um"). Também esse parece dúbio agora, no momento em que conservadores brandem as armas do Estado para atacar os direitos LGBTQ, o aborto legal e, em alguns círculos extremos, até mesmo a liberdade na Ucrânia.
É verdade que, como historiadora, sou obrigada a destacar que nós, gringos, não estamos tão divididos hoje quanto em 1964, quando a Guerra do Vietnã estava pegando fogo e os direitos dos negros estavam sendo afirmados; ou em 1861, no início de nossa extremamente sangrenta Guerra Civil, também travada em torno das liberdades negras. O Brasil fez melhor.
Mas o que significa esse lema "ordem e progresso"? Vocês sabem que vem de Auguste Comte (1798-1857), o repulsivo filósofo francês dito "positivista". Comte recomendava que a sociedade fosse planejada e governada de cima para baixo por engenheiros sociais que "saberiam para poder prever e preveriam para poder dominar".
E eis o problema: isso não funciona para o progresso. Se "ordem" significa o que tanto os conservadores quanto os socialistas desejam, é um lema de ordenação de cima para baixo. Ordens decretadas de cima para baixo funcionam muito bem para o que é rotineiro. Mas bloqueiam o progresso.
A razão disso é simples, se bem que os generais e planejadores não tenham recebido o memorando. É que o progresso, é claro, vem de ideias novas nascidas de mentes humanas individuais, não de "investimentos", "políticas públicas" ou "regulamentos" rotineiros. Uma ideia para uma barraca de frutas no Rio de Janeiro ou uma ideia para um avião de nicho em São José dos Campos nasce da mente de alguém, não de empilhar tijolo sobre tijolo ou de uma política de taxar um brasileiro para subsidiar outro, tampouco de um regulamento que sufoca a inovação nas barracas de frutas ou nos aviões.
E há uma razão mais profunda pela qual tal ordem não funciona. É que a maior parte de nossas vidas é feita de ordens espontâneas. A língua portuguesa. A música brasileira. Seu círculo de amigos. Suas ideias empreendedoras. Será que é boa ideia matar essas ordenações produzidas pela mente? Não, exceto se você acredita no positivismo comtiano.
Meu conselho? (sem custo extra). Reescrevam o lema para ser "Liberdade e Progresso".
ilustração 'Bandeyra' do artista Frederico Costa, que substitui o verde por rosa e a faixa de 'Ordem e Progresso' por um arco-íris
FOLHA