A pregação de Jair Messias: Deus, armas e insultos ao STF
BERNARDOMELLOFRANCO
O pretexto era inaugurar uma estação de trem em Parnamirim, no Rio Grande do Norte. O prefeito reduziu o expediente e liberou os servidores para engrossar a claque. Jair Bolsonaro chegou ao palanque montado num cavalo branco. Depois de ser adulado por três ministros, entregou o microfone a um pastor evangélico. Seguiu-se um comício disfarçado de culto, com transmissão ao vivo na TV Brasil.
“Vamos fazer uma oração especial pelo nosso presidente. Levantemos nossas mãos para o céu em clamor a Deus”, ordenou Martim Alves, da Assembleia de Deus. “Pedimos uma bênção muito especial para o presidente da nossa República, pela sua saúde, seu governo e sua família”, prosseguiu.
O bispo Lindomar Sousa, da Igreja Sara Nossa Terra, assumiu o púlpito e continuou a pregação eleitoral. “Não é mais uma briga da esquerda contra a direita, é uma guerra espiritual”, proclamou. “Deus levantou a vida deste homem”, disse, referindo-se ao capitão.
O ministro Rogério Marinho já havia apelado ao discurso religioso para louvar o chefe. Candidato ao Senado, acusou a oposição de “espezinhar”, “maltratar” e “ridicularizar” a família brasileira. Em seguida, manifestou o desejo de silenciar os adversários. “Eles têm que escutar e ficar calados”, decretou.
Jair Messias inflamou o rebanho com um grito de rodeio. Exaltou o “povo armado”, atacou os “vermelhos” e definiu a Presidência como uma missão divina. “A luta, como disse o pastor agora há pouco, não é da esquerda contra a direita, é do bem contra o mal”, bradou.
Na semana em que um escândalo de propinas derrubou seu quarto ministro da Educação, ele descreveu a corrupção como um problema de governos passados. Depois empilhou chavões sobre o “país maravilhoso” e sua “gente trabalhadora”. Em 16 minutos de falatório, não disse uma palavra sobre a obra usada como desculpa para o comício com dinheiro público.
A performance deu uma amostra do Bolsonaro que disputará a reeleição em outubro: um político sem pudor de explorar a fé e usar a máquina em benefício próprio.
No dia seguinte, em Brasília, o capitão começou e terminou um discurso citando o nome de Deus. Recheou o monólogo com elogios à ditadura militar e ao deputado Daniel Silveira, que armou um circo para descumprir decisão do Supremo. Ao defender o brucutu, voltou a insultar ministros da Corte. “Cala a boca, bota a tua toga e fica sem encher o saco dos outros”, decretou.
GLOBO