Para falar do OTA
A íntegra de minha entrevista para O Globo, para falar do OTA:
1) Você pode me contar um pouquinho de como era o Ota como amigo?
Ota foi meu colega de faculdade, há quase 50 anos, e Ota ali já era essa pessoa que vivia quadrinhos o tempo todo. Ele fazia uma série continuada (que durou anos) onde ia desenhandamigo da família – minha filha escreveu hoje que perdeu um tio. Claro, brigamos muito – às vezes era difícil acompanhar sua velocidade criativa e emocional. Na época do Orkut existia um gruo tudo que acontecia com ele e com quem conhecia naquele dia (e noite). Ota sempre foi isso, existiu simultaneamente no mundo real e no mundo dos quadrinhos.
Ali na faculdade embarcamos numa aventura doida que foi transplantar para o público brasileiro uma revista de humor chamada MAD. Trabalhamos juntos na MAD por muitos anos e depois em outras publicações e projetos. Mas mais do que parceiro de trabalho Ota foi uma pessoa muito querida, amigo da família – minha filha escreveu hoje que perdeu um tio. Claro, brigamos muito – às vezes era difícil acompanhar sua velocidade criativa e emocional. Na época do Orkut existia um grupo (grande) chamado “Ota me mandou tomar no c(*)”, só de pessoas com quem ele tinha brigado. Podia ser irrascível mas quase sempre era incrível. O Incrível Ota.
2) O que significa essa perda para você?
Olha, mais do que tristeza, eu sinto muita revolta. É um absurdo imenso o Ota´, por tudo que fez e pela sua genialidade, não ter tido – principalmente nos últimos anos – maior reconhecimento. Seus tempos finais foram sem trabalhos e sem dinheiro. Embora continuasse produzindo, sem parar, preparava um livro compendio das tiras da Garota Bipolar. Os quadrinhos ainda são marginalizados no Brasil, e o Ota, um ser dos quadrinhos, vivia uma vida à margem, uma lembrança para todos que cresceram com a MAD, mas sem espaço para a sua produção atual e sua experiência como editor.
3) O que, na sua opinião, fez o Ota se tornar uma referencia?
Ota é uma referencia para o mundo dos quadrinhos, pelo profundo conhecimento que ele tinha – uma enciclopédia de fatos e pessoas, um colecionador impulsivo – e pelos trabalhos que realizou como editor, desde que começou, aos 15 anos, na Editora EBAL. Não só muita gente nova começou a publicar profissionalmente nas revistas que editou, como abriu espaço para veteranos que não tinham onde publicar seus quadrinhos.
E Ota é um referencia para os fãs, as sucessivas gerações que aprenderam humor com seus desenhos e suas revistas. Tinha muita identificação com o público adolescente – daí falei em sucessivas gerações – pois não envelhecia, seu humor – e ele – eram malucos, sem amarras, com a visão de mundo pirado e bagunçado e engraçado que os adolescentes costumam ter. Ota nunca deixou de ser adolescente, no seu universo humorístico particular, do qual sai agora pra entrar pra história (em quadrinhos).