O que há por trás do lobby de Bolsonaro pelo uso da cloroquina - CartaCapital
"O dono do laboratório que produz o Reuquinol é Renato Spallicci, bolsonarista empedernido. Até fechar o acesso às suas redes sociais, o empresário tinha o hábito de atacar Lula e Dilma Rousseff e defender o ex-capitão. Em um dos posts, exibiu um desenho de Bolsonaro com o tradicional gesto da arminha, acompanhado do seguinte texto: “Acordar sabendo que seu presidente não é do PT, não tem preço”. Na campanha presidencial de 2018, fez questão de se declarar: “Renato Spallicci vota em Bolsonaro”. Apesar de atuar no setor farmacêutico, ele abraça as teorias da conspiração a respeito da origem da epidemia, atribuída ao “vírus chinês”. No Twitter, além de defender a cloroquina, o empresário dissemina: “O Covid nasceu na China, cresceu na Itália, estourou na França, fez graduação na Espanha, doutorado nos EUA e política no Brasil”. Ele curte mensagens do general Augusto Heleno, chama políticos progressistas de comunistas e dá aval à tese de que João Doria, governador paulista, e Alexandre Kalil, prefeito de Belo Horizonte, apreciam a “ditadura chinesa”.
Um apoio tão entusiasmado haveria de ser recompensado. Brasília influiu diplomaticamente para alavancar a produção de Spallicci. Uma troca de mensagens entre o embaixador brasileiro em Nova Délhi, Elias Luna Santos, e autoridades da Índia mostra que o Itamaraty intermediou a negociação para a importação de insumos usados na fabricação da hidroxicloroquina. Quem ganhou com as negociações? A Apsen, empresa do aliado. “A fabricação depende de matéria-prima importada, em sua maior parte da Índia. Em 25 de março de 2020, o governo indiano proibiu a importação desses insumos devido à grande demanda mundial. (…) Foi estabelecido um canal de comunicação aberto com o Ministério da Saúde e demais órgãos na esfera federal – respeitando todas as regras setoriais e o cumprimento das leis do País – com o objetivo da manutenção do atendimento de pacientes crônicos, para que não houvesse interrupção ou prejuízo em seu tratamento. O governo atuou a partir dessa interlocução ampla e geral do setor para a liberação”, informa a Apsen em nota. A empresa diz ainda que Spallicci não mantém qualquer relação pessoal com Bolsonaro.
Outro beneficiado é o EMS, controlado pelo empresário Carlos Sanchez. Um dos maiores bilionários do País, segundo a revista Forbes, fortuna calculada em 2,5 bilhões de dólares, Sanchez reuniu-se ao menos duas vezes com Bolsonaro, desde o início da pandemia. Meses atrás, em nota oficial, o laboratório admitiu a ineficácia do medicamento no tratamento do vírus. “As pesquisas foram conduzidas pela Coalizão Covid-19 Brasil, formada pelos hospitais Israelita Albert Einstein, Sírio-Libanês, HCOR, Oswaldo Cruz, Moinhos de Vento, Beneficência Portuguesa, Rede Brasileira de Pesquisa em Terapia Intensiva (BRICNet) e BCRI. O resultado, publicado no New England Journal of Medicine no dia 23/07, atestou que o medicamento não promoveu melhoria nos quadros clínicos”.
O terceiro desta lista é o Cristália, cujo cofundador e acionista, Ogari de Castro Pacheco, é aliado de Bolsonaro, filiado ao DEM e segundo suplente do emedebista Eduardo Gomes, ex-líder do governo no Senado. Em nota, o laboratório nega ter lucrado com o medicamento. O Quinacris, diz a nota, é fornecido unicamente ao Sistema Único de Saúde e a hospitais particulares e o fato de não ter havido uma alta das doenças para as quais o medicamento é recomendado – malária, amebíase hepática, lúpus –, igualmente não ocorreu um “aumento significativo na produção ou venda”.
mais na reportagem de Ana Flávia Gussen
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