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    sexta-feira, novembro 13, 2020

    O maricas e o ferrabrás

     

    SERGIO RODRIGUES

    Tem que deixar de ser um país de maricas.” E assim a gente descobre que o Brasil de 2020 ainda não deixou de ser um país em que uma palavra tão imbecil pode sair da boca de um ferrabrás.

    Maricas é um velho termo pejorativo para homem gay ou pouco viril, do tempo em que se chamava de ferrabrás o valentão, o machão briguento. Ou seja, do tempo que, em priscas eras, era chamado de “priscas eras”.

    O mundo evocado por maricas e ferrabrás é um lugar mais escuro, ainda sem luz elétrica ou mal apresentado a ela, aos valores iluministas e às convulsões políticas, sociais e comportamentais do século 20.

    O tempo histórico do qual nos chega a voz insegura e meio esganiçada desse desolador presidente da República é o da Revolta da Vacina e o de um analfabetismo maciço.

    Desde então, o ferrabrás se recolheu ao asilo das palavras semimortas, ao lado do pincenê e da escarradeira. O maricas, somos lembrados de repente, ainda circula por aí, embora não disfarce certo fedor putrefato.

    Eu gostaria de falar da palavra isolada. Esquecer por instantes —como se fosse possível— que Bolsonaro a empregou para atacar com sordidez os que defendem a vida e a saúde dos brasileiros.

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    Esquecer também —ou deixar de lado por ora— que tal uso é cheio das piores intenções, equilibrado entre a sinceridade troglodita e o cálculo cínico da cortina de fumaça. E ainda que toda homofobia é bandeirosa.

    Por fim, proponho deixar para outra hora a discussão sobre como inverter o sinal de uma ofensa e transformar uma palavra insultuosa em emblema de orgulho.

    Vamos falar do maricas em si, do vocábulo que o português foi buscar há séculos no espanhol, derivado cômico do nome próprio Maria.

    Quando era empregado, digamos, em 1920, soava mais aceitável. Na época em que nossos bisavós tinham menos idade do que temos hoje, éramos todos menos esclarecidos.

    Não que o pessoal fosse necessariamente mais homofóbico —é só que ninguém tinha vergonha de ser. Pelo contrário, se orgulhava. A homofobia era parte da cola social de uma época mais dura e rangente em suas engrenagens.

    Outros ingredientes daquela goma eram o machismo, o racismo, o puritanismo, o preconceito de classe, o patriarcalismo, a hipocrisia, a naturalização da violência.

    É verdade que até hoje os atrasados, os reacionários, os oportunistas e os boçais se orgulham de sua homofobia e do resto da lista. Mas faz tempo que a cola vem deixando de funcionar.

    Cem anos de história ensinaram alguma coisa à parcela da humanidade que procura atualizar seu vocabulário e suas ideias pelo fuso horário do planeta. Ou pelo menos tenta não ser babaca.

    O mundo se distanciou do tempo em que o aquecimento global não era nascido, as casas não tinham geladeira e os homens homossexuais eram chamados de frescos. Demorou.

    Era uma época intolerável, na qual se arrancava dente sem anestesia e as mulheres não podiam votar. A homofobia brejeira de maricas podia ser encontrada numa grande variedade de espécimes vocabulares —adamado, jeitoso, delicado, mulherico.

    Já a família lexical do ferrabrás incluía façanhudo, arrotador, bichão, traga-balas. “Mariquinhas”, cuspia entredentes o mata-sete, o papudo. “Salta-pocinhas”, ria o rufião que espancava a mulher três vezes por semana e era admirado por isso na vizinhança.

    O catastrófico atraso civilizacional representado por Jair Bolsonaro é difícil de medir, mas cabe inteiro em seu “país de maricas”.






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