Menino Maluquinho em sua versão quarentona
A pedido do GLOBO, autores reimaginam o Menino Maluquinho, personagem de Ziraldo, em sua versão quarentona.
Roger Mello
Escritor e ilustrador, autor de "Selvagem" (2010)
Ai,
menino, que coisa doida te ver aqui. Disseram mesmo que você viria, a
calça rasgada no joelho, eu sei, você não paga por roupa de grife já
puída de fábrica. É rasgo de quem ainda cai de árvore, de quem
finalmente entendeu a coisa de ter macaquinhos no sótão e as pernas
maiores que o mundo. Menino, rapaz, fazem o quê? Quarenta anos?
Mais
que a idade do seu pai quando o Ziraldo te desenhou no papel. E a Vilma
disse que gostou de ver um filho feito de tinta preta. Você ficou mais
alto que os outros, justo você, o mais maluquinho, o mais bonitinho da
turma. Sua panela-chapéu apita quando uma ideia vem, uma panela
bluetooth que conversa com o celular. Agora confessa, caiu de um pé de
quê? De fruta-pão? Lembra o Ziraldo falando pra gente que trouxeram a
fruta-pão e espalharam pelo mundo para matar a fome? É que precisamos de
gente como a gente dele, o Darcy, a Maria Martins, o Burle Marx, o Joel
Rufino. Gente que sabia de frutas, mapas e assombrações. Gente que
sonhava o país como quem esboça um livro. Fomos ficando enviesados, né,
menino? Tristes mesmo. Como uma calça puída que custa uma nota mas não
vale tostão. Bora, Maluquinho, o resto da turma está esperando a gente
se manifestar.
ilustração: Roger Mello