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    Fragmentos de textos e imagens catadas nesta tela, capturadas desta web, varridas de jornais, revistas, livros, sons, filtradas pelos olhos e ouvidos e escorrendo pelos dedos para serem derramadas sobre as teclas... e viverem eterna e instanta neamente num logradouro digital. Desagua douro de pensa mentos.


    domingo, agosto 28, 2016

    Geneton

    De MAURO VENTURA

    Encontrei anotações da entrevista que fiz em 2007 com Geneton Moraes Neto. É uma aula de jornalismo e de vida. Alguns tópicos:

    Alegrias do jornalismo:

    - Que outra profissão me daria a chance de ficar conversando sozinho com Woody Allen durante uma hora numa suíte de um hotel em Londres? Ele falou do pavor da morte. Dizia que quando acabava de fazer um filme tinha que começar outro imediatamente, antes mesmo de lançar o anterior. “Porque se eu parar, se olhar para o lado tem aqui uma nuvem no meu ombro que é a morte.” Falei: “Mas você é o Woody Allen, seus filmes vão ser estudados daqui a 50 anos.” Ele respondeu: “Mas eu quero a imortalidade hoje, no meu apartamento, e não daqui a 50 anos.”

    - O jornalismo me deu a chance de conversar com a última sobrevivente do Titanic. Ia ser no hotel, mas sugeri levá-la para o porto onde o navio zarpou. Ela falou das superstições que tinha, do pai que morreu no naufrágio. Ela já estava com mais de 80 anos. Ventava muito, era inverno, um frio desgraçado, a mulher começou a ficar meio trêmula, falei ao cinegrafista: “Bota ela no carro correndo, vamos voltar para o hotel, porque essa mulher escapou do Titanic e vai morrer na mão da gente!”. Continua viva, graças a Deus.

    Os derrotados:

    - Tenho uma certa fascinação pelos derrotados, jornalisticamente é melhor. A história dos vencedores pode ser óbvia e chata, mas a dos derrotados é sempre fascinante. A dos jogadores de 50 talvez seja mais fascinante que a dos de 70.

    - Um caso clássico que entrevistei de derrotado foi o agente secreto do FBI encarregado de vigiar Lee Oswald. Obviamente ele falhou na sua missão de seguir os passos de Lee, e o presidente Kennedy foi assassinado. Quando Lee foi preso estava com o nome e o telefone do agente no bolso. Lee reclamou, disse “ele esteve na minha casa, importunou minha mulher”. Fui até o fim no mundo, no Kansas, atrás do agente. Achei que tinha errado o endereço. Encontrei o cara sozinho, viúvo, com um filho único, excepcional. Fiquei pensando: “Meu Deus do céu, ele carregou esse fardo até hoje, de ter falhado.” Foi um caso bem melancólico.

    Saia-justa:

    - Talvez o momento mais constrangedor que já passei tenha sido com o Oscar Niemeyer. Tinha lido num perfil uma referência a uma festa de que ele teria participado com Ary Barroso, Di Cavalcanti, alguns arquitetos estrangeiros e seis mulheres. Sempre tento abordar os assuntos inconvenientes de forma a não ser agressivo. Aí, no meio da entrevista, virei para ele, que já tinha mais de 90 anos, e perguntei: “É verdade que o senhor participou de uma festa com Ary Barroso...” Até aí tudo bem. “...com Di Cavalcanti, um grupo de arquitetos estrangeiros, seis mulheres...” Tudo continuava bem, até eu dizer a última frase. “...E todo mundo estava nu.” Ficou aquele silêncio no escritório dele, se passasse um mosquito a gente ouvia. Ele ficou calado até que respondeu: “Agora você me chateou, isso não é coisa que se fale numa entrevista.” Esperei que ele dissesse: “Se levante e vá embora.” Ele falou: “Você sabia que já acabei com uma entrevista na primeira pergunta, com um rapaz que veio lá de São Paulo?” Mas Niemeyer acabou confirmando a história, ao contar: “Olha, quer saber de uma coisa? Isso faz parte da vida. Às vezes essas coisas podem acontecer. A gente gosta de sacanagem. Mas você não vai usar isso na televisão, né?” Em respeito ao pedido dele a gente não usou.

    Dia a dia da profissão:

    - Batizei de Síndrome da Frigidez Editorial o seguinte: chega uma hora em que o jornalista pensa que tudo é normal. É aquela figura triste da redação do derrubador de matéria: “Isso já saiu”, “Isso não é novidade”. Mas sempre tem coisa nova para dizer sobre alguma coisa.

    - Muitos entrevistados estrangeiros estão acostumados ao “New York Times”, então quando fala TV Globo às vezes tem que explicar o que é, respondem seis meses depois. A assessoria de Jerry Lewis disse secamente; “Ele não vai dar entrevista a você porque o tempo disponível para jornalistas será todo dedicado à imprensa inglesa.” Alguns cobram, como a viúva de Lee Oswald, que queria 15 mil dólares para falar. Ficou para a próxima encarnação.

    - Jornalisticamente tenho tanto interesse por Churchill como por Hitler.
    Persistência:

    - 90% do que fiz foi por conta própria. Saí catando os 11 jogadores e o técnico da Copa de 50, sem receber um centavo qualquer. Também resolvi perturbar Drummond atrás de uma entrevista sem nenhum editor pedir. Da mesma forma, também por minha conta, procurei nos arquivos dos governos ingleses e americanos documentos secretos sobre políticos brasileiros.

    Humildade:

    - Sou uma aberração em TV. Não falo para a câmera, sou a pessoa menos fotogênica do Cone Sul.

    - Chega um momento em que o espelho diz: “Você não vai ser nada na vida, não vai mudar o mundo, não vai ser o guitarrista dos Beatles, então trate de exercer essa maldita profissão da melhor maneira possível.”
    - Sou a pessoa mais antissocial do mundo. Por isso não tenho amigo famoso.

    - É uma inversão total eu estar aqui dando essa entrevista a você. Jornalista que se acha importante morreu para o profissão. Sou só um intermediário. Joel Silveira me contava que estava na redação escrevendo uma matéria como se fosse mudar a história da humanidade. Nelson Rodrigues estava olhando e disse: “Patético”. E foi embora. Não devemos perder nunca essa noção de que no fundo somos todos meio patéticos.

    - Se existe jornalista que rasga dinheiro esse sou eu. A única coisa interessante e útil no jornalismo é ver e ouvir coisas interessantes e tentar contá-las da melhor maneira possível. Ponto final.

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