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    terça-feira, junho 03, 2025

    Sebastião Salgado, um homem de seu tempo


    Fotógrafo construiu sua linguagem dentro de um campo de compromissos éticos e políticos

    Por , Especial para o GLOBO

    Desde o início dos anos 1970, quando começou a fotografar, Sebastião Salgado (1944, Aimorés, MG — 2025, Paris, França) construiu sua linguagem dentro de um campo de compromissos éticos e políticos que o acompanharam em seus posicionamentos e escolhas pessoais frente ao mundo de seu tempo, — nosso tempo — , em suas inúmeras contradições, violências e iniquidades.

    Economista por formação, exilado na Europa com sua companheira Lélia Wanick Salgado durante a fase mais sanguinária da ditadura militar brasileira, atuou como fotógrafo a partir de 1973, realizando desde projetos fotográficos menos conhecidos, mas não menos importantes, como sua extensa documentação da Revolução dos Cravos em abril de 1974 e das lutas pela independência das então ainda colônias portuguesas na África, como também sua importante documentação no Brasil e na América Latina nos anos seguintes, até os mais recentes projetos de grande envergadura e repercussão, como Gênesis e Amazônia, precedidos de incursões intensivas e prolongadas em territórios percorridos extensivamente na construção de projetos de reflexão e denúncia em torno de temas de justiça social, como Êxodus e Trabalhadores, junto com a incisiva documentação realizada na África sobre a inaceitável fome no Sahel e o brutal etnocídio e genocídio em Ruanda nos anos 1980 e 1990, tragédias contemporâneas, representativas de um ainda vigente neocolonialismo geopolítico nefasto e predatório, extensivamente documentadas por Salgado.

    Esta foi a sua trajetória ao longo de 50 anos de fotografia, cinco décadas que também transformaram radicalmente tanto o campo da informação, do jornalismo e dos meios de comunicação, como o próprio alcance e protagonismo do terceiro setor com quem Salgado intensamente colaborou neste período de permanente comprometimento com a documentação e difusão das tragédias sociais, políticas e ambientais de nossos tempos. Período também em que o próprio campo e circuito das artes se transformaram, através da incorporação da fotografia e de suas linguagens neste campo de criação e crítica, que se projeta hoje como importante protagonista na convergência das artes e da política, através do crescente avanço das práticas efetivas de inclusão e diversidade no campo cultural e identitário, onde a representação do outro dá lugar à voz própria e à auto-representação dos marginalizados e excluídos.


    Neste contexto e período de contínua transformação nas artes e na cultura, Salgado fez da proximidade, frontalidade, empatia eengajamento os elementos estruturantes de sua aproximação política de temas sensíveis e perturbadores, em fortes imagens em preto e branco construídas através de elementos pictóricos descortinados e realçados pela luz existente, em escolhas que privilegiam um olhar desde sempre influenciado pelas experiências de contra-luz de sua infância e adolescência, sob a luz forte e dramática dos céus de sua terra natal em Minas Gerais no Brasil.
    posição em Botafogo traz seleção de 30 fotos

    Denúncia de contradições do capitalismo

    Na sua relação com o outro, com os indivíduos retratados em seus diferentes projetos que denunciam as contradições de um sistema econômico e geopolítico global de exclusão, violência e exploração de boa parte das populações em diferentes países, suas imagens frontais dos olhares de jovens, mulheres, crianças e idosos, muitos no limite de suas forças e capacidade de resiliência e sobrevivência, revelam aquilo que para o escritor David Levi Strauss (1953, Kansas, EUA) distingue o trabalho de Sebastião Salgado: imagens que tem como ponto de partida o engajamento do fotógrafo com as lutas de superação das grandes contradições de seu tempo, através de registros construídos com empatia e respeito pelos retratados, em imagens que demonstram que mesmo em condições extremas, como as de absoluta fome e privação causadas pelos processos contemporâneos de concentração de renda e capital e contínua exploração e depreciação dos recursos naturais e ambientais, a dignidade humana permanece nos olhares resilientes e muitas vezes desafiadores daqueles que retratou.

    Que estas imagens tenham sido tomadas como eventual estetização da pobreza talvez revele mais das transformações por que vem passando o próprio campo da cultura e das artes ao longo destes cinqüenta anos, onde os processos intensos de crescente industrialização, urbanização, desenraizamento, alienação e virtualização/espetacularização da vida em sociedade avançam de forma avassaladora sobre todos, influenciando fortemente tanto a crítica como a própria percepção sobre a representação daqueles que foram sempre objeto de atenção e empatia de Salgado, os deserdados da terra que em sua condição concreta existencial, social e ambiental negam frontalmente tanto as utopias desenvolvimentistas como as distopias fundamentalmente cosmopolitas da atualidade.

    A obra de Salgado permanecerá, portanto, como um dos maiores legados a referenciar o debate crítico sobre o significado e alcance da imagem documental fotográfica e de sua construção autoral na intersecção das esferas da comunicação e das artes, campos de disputa na construção do simbólico e da representação social e política de nosso tempo.

    Descanse em paz, Sebastião!

    Sergio Burgi é coordenador de fotografia do Instituto Moreira Salles



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