Se estivesse vivo, PC Farias se envergonharia de Collor
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Bernardo Mello Franco
O Congresso estava abarrotado. Em clima de festa. Depois de quase três
décadas, o país voltava a ter um governo escolhido por voto direto.
Recebido com aplausos, o presidente eleito acenou para as galerias, fez o
V da vitória e prestou juramento. No discurso de posse, proclamou o
início de uma era de “reconstrução nacional”.
“Nada repugna mais ao espírito de cidadania que a corrupção”, bradou. Em tom solene, ele anunciou uma “luta pela moralidade” e decretou o fim do uso do Estado como “instrumento de ganho pessoal”. Herdeiro de duas oligarquias, disse carregar no sangue o “sentimento da vida pública como dever e como missão”. “Não viver da política, mas viver para a política”, pontificou.
Lido em 15 de março de 1990, o falatório marcou o início da presidência de Fernando Collor. Em dois anos e meio, o orador seria varrido do Planalto, acusado das mesmas práticas que prometia combater.
O ex-presidente perdeu o cargo, mas não perdeu a pose. Nem a liberdade. Denunciado por corrupção passiva, foi absolvido em 1994 por um Supremo Tribunal Federal que não sabia o que era mandar réus ilustres para o xadrez.
Após um autoexílio em Miami, Collor retornou à política. Apesar da folha corrida, conseguiu se eleger duas vezes senador. Em 2014, voltou a ser absolvido por rolos da República de Alagoas. A lentidão do processo constrangeu a cúpula do Judiciário. Quando o julgamento começou, dois dos três crimes descritos na denúncia já estavam prescritos.
“Punir alguém em 2014 por fatos ocorridos em 1991 seria quase como punir outra pessoa”, protestou o ministro Luís Roberto Barroso. “Isso é um retrato de como funciona a Justiça brasileira”, emendou Joaquim Barbosa.
No terceiro encontro com o Supremo, a sorte de Collor virou. Em 2015, ele foi acusado de receber propina para inflar contratos da BR Distribuidora nos governos Lula e Dilma. Depois de oito anos e quatro procuradores-gerais da República, a Corte decidiu condená-lo. A defesa ainda conseguiu retardar em dois anos a execução da pena. Na manhã de sexta, o ex-presidente finalmente foi recolhido ao xadrez.
Protagonizado por um profissional do ramo, o esquema na BR espantou pelo amadorismo. A Polícia Federal encontrou comprovantes de depósitos ilegais nas contas de Collor. A corrupção foi documentada em recibos, e-mails e planilhas. Se estivesse vivo, PC Farias se envergonharia do comparsa.
Gilmar e Collor
No dia em que Fernando Collor foi em cana, Gilmar Mendes tentou interromper a análise do caso no plenário virtual do STF. Recuou na manhã seguinte, quando a maioria da Corte já havia referendado a ordem de prisão.
Essa não foi a primeira boia que Gilmar lançou ao ex-presidente. Em 2023, ele votou para absolvê-lo no escândalo da propina com recibo. Vencido, pediu vista e retardou o processo por mais quatro meses. Depois propôs reduzir a pena pela metade, o que livraria o réu de dormir na cadeia.
Há 33 anos, o supremo ministro integrava a defesa de Collor no processo
de impeachment. Apesar da relação antiga, nunca se declarou impedido de
julgar o ex-chefe.
O GLOBO


