Afinal, o que querem do governo Lula?
Gabriel Trigueiro
Assisto à Thaís Oyama, colunista do UOL, em vídeo sobre uma fala recente do Lula, na qual o presidente argumenta que “tem lado”, e que governa “para os pobres”. O vídeo da colunista é uma sucessão de equívocos, mas vou me ater aqui somente aos dois erros principais.
Em primeiro lugar, há uma forçação de barra tremenda, para não dizer má-fé explícita, em caracterizar a fala do presidente como uma demonstração de polarização ou de radicalização do discurso público.
Veja, quando você assiste ao discurso, fica claro que não é que Lula tenha dito que vai governar apenas para a militância do PT, apenas para a esquerda ou apenas para quem tem uma tatuagem com a cara do Karl Marx, em estilo old school, do lado esquerdo da bunda. Não, o sujeito só pontua que, embora seu governo seja para todos, a ênfase é na assistência aos mais vulneráveis.
Mas, por algum motivo que me escapa, para Thaís Oyama isso soa como uma declaração quase stalinista de que o governo deseja coletivizar os meios de produção e enviar os inimigos políticos para um gulag em Osasco, sei lá eu.
Em segundo lugar, há aquela velha ideia equivocada, mas que de tanto que é repetida à exaustão a essa altura já ganhou ares de verdade, de que Lula ganhou “por uma margem apertada” do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Assim, de fato Lula ganhou com uma margem de apenas 1,8% dos votos válidos. Mas esse, é claro, é um número que não tem valor absoluto, mas apenas relativo. O contexto geral importa, caraio.
Esse 1,8% tem que ser interpretado levando-se em consideração que, por um lado, não apenas Lula, mas também o PT, foram submetidos a uma máquina de assassinato de reputações como jamais se viu, e desproporcional à cobertura midiática que outros partidos e agentes políticos muito mais corruptos e envolvidos em terrenos moralmente muito mais pantanosos jamais tiveram.
Por outro lado, não pode ser tratado como um dado irrelevante, ou secundário, o fato de que Jair Bolsonaro tenha sido o primeiro presidente da república, desde que foi instituído o mecanismo da reeleição, a não conseguir se reeleger — a despeito da quantidade obscena de crimes eleitorais e de responsabilidade cometidos, sobretudo durante a reta final da campanha.
O fato de que Jair tenha sido incompetente nesse nível, o fato de que, mesmo com a máquina na mão e diante de um antagonista sem a simpatia do empresariado e da grande imprensa, tenha perdido uma eleição, bicho, essa é a notícia. Esse é o sujeito mordendo o cachorro.
A verdade é a de que a diferença de 1,8%, considerando, é claro, a assimetria da correlação de forças dos agentes políticos, foi um baita resultado para Lula e um péssimo resultado para Bolsonaro.
O papo de “margem estreita” só faz sentido se você for 1) da ala derrotista da esquerda (cada vez mais em expansão, infelizmente); 2) de direita ou 3) bom de matemática, mas ruim de interpretação.
CONFORME SOLICITADO
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