Mauro Cid opta por silêncio na PF, mas seu celular segue acusando Bolsonaro
Leonardo Sakamoto
O tenente-coronel Mauro Cid mostrou, nesta quinta (18), em depoimento à Polícia Federal, que não aceitará levar a culpa sozinho pelas mutretas do antigo empregador, Jair Bolsonaro. E, ao optar pelo silêncio, garante que a quebra do sigilo de seu celular continue falando por ele, acusando o ex-presidente da República, sua família e aliados.
Jair Messias esperava que Cidinho assumisse a culpa pelas fraudes no registro de vacinação do ex-presidente. Ou que, pelo menos, o isentasse de responsabilidade. Não rolou. O ex-faz-tudo de Bolsonaro reivindicou o direito ao silêncio.
Sinais, fortes sinais. Na semana passada, ele já havia trocado o advogado Rodrigo Roca, próximo da família Bolsonaro, por Bernardo Fenelon, especializando em crimes de corrupção e... delação premiada.
O fato de ele ter declarado independência em sua banca de defensores, colocado alguém que manja de colaboração com a Justiça e se negado a isentar o ex-presidente em seu depoimento é um recado de que não está a fim de entrar na longa fila de aliados abandonados por Bolsonaro na beira da estrada. Lista que começa com Gustavo Bebianno, passa por Roberto Jefferson e chega em Daniel Silveira.
Em seu depoimento sobre a investigação de fraude no registro de vacinação contra a covid-19, nesta terça (16), Bolsonaro tirou o corpo fora - como sempre. Disse que confiava em Cid, mas jogou a bomba no colo alheio, dizendo que se o ex-ajudante de ordens fez algo, é responsabilidade só dele.
Ou como consta no depoimento: "se Mauro Cid arquitetou foi à revelia, sem qualquer conhecimento ou orientação do declarante".
O tenente-coronel é leal a Jair, mas não é burro. É difícil imaginar que, por conta própria, fraudou o cartão de vacinação da primeira-família, uma vez que assistia, preocupado, às maracutaias ocorrerem em sua frente no Palácio do Planalto e dava o alerta.
No sábado (13), reportagem de Aguirre Talento, no UOL, apontou que diálogos descobertos no celular de Cid mostravam-no tentando avisar Michelle Bolsonaro que usar o cartão de crédito de uma amiga e pagando a ela em dinheiro vivo desaguaria em denúncia de rachadinha, ou seja, de desvio de grana pública.
A uma das assessoras da então primeira-dama, Cid foi claro: "O Ministério Público, quando pegar isso aí, vai fazer a mesma coisa que fez com o Flávio [Bolsonaro], vai dizer que tem uma assessora de um senador aliado do presidente, que está dando rachadinha, tá dando a parte do dinheiro para Michelle". Não surtiu efeito.
Sabendo que o ex-chefe é campeão olímpico de Arremesso de Responsabilidade à Distância, de Maratona de Terceirização de Culpa e de Luta Livre para Tirar o Corpo Fora, Cid está tratando de deixar claro que essa bronca não vai assumir.
Mas, como pode ser visto na declaração transcrita acima, obtida através da quebra de sigilo telemático de seu celular, se Mauro Cid não falar contra Jair, seu celular continuará falando por ele. E há uma farta quantidade de material obtida do backup do seu aparelho na nuvem.
Ao que tudo indica, há muita coisa lá dentro: de sacanagens que beneficiaram financeiramente a família imperial bolsonarista até diálogos sobre o planejamento de um golpe de estado, como na conversa entre ele e o amigão do ex-presidente, o ex-major Ailton Barros.
Com Cid em silêncio e o seu celular gritando para a PF, a PGR e o STF, como será que está o nível de tensão no bunker de Bolsonaro neste momento?
UOL