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  • O BRASIL EH O QUE ME ENVENENA MAS EH O QUE ME CURA (LUIZ ANTONIO SIMAS)

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    Fragmentos de textos e imagens catadas nesta tela, capturadas desta web, varridas de jornais, revistas, livros, sons, filtradas pelos olhos e ouvidos e escorrendo pelos dedos para serem derramadas sobre as teclas... e viverem eterna e instanta neamente num logradouro digital. Desagua douro de pensa mentos.


    quinta-feira, março 16, 2023

    Descaso homicida

     

     
    A ditadura matou 8 mil indígenas sem disparar um tiro. Bastaram as obras de ‘integração’ da Amazônia em nome do ‘progresso’

    Por Maria Rita Kehl
    Os indígenas estão de volta ao no-
    ticiário. Desta vez, como vítimas
    de atividades criminosas do ga-
    rimpo. Todos viram as fotos de adultos
    e crianças raquíticos, assolados pela fo-
    me, porque a mineração ilegal matou os
    peixes e envenenou os rios, elementos es-
    senciais para a sua subsistência.
     
    Quando fui convocada pela presiden-
    ta Dilma Rousseff a integrar a Comissão
    Nacional da Verdade, soube que a indica-
    ção de meu nome provinha do MST. Por
    isso escolhi investigar as violações come-
    tidas contra camponeses, a exemplo dos
    agricultores torturados para revelar o pa-
    radeiro dos guerrilheiros do Araguaia – e
    nada revelaram – ou do grande líder ma-
    ranhense Manoel da Conceição, que per-
    deu uma perna na tortura. Foram entre-
    vistas marcantes, mas não é desses perso-
    nagens que vou tratar aqui.
     
    Acontece que a investigação sobre as
    graves violações contra grupos indíge-
    nas veio nesse mesmo “pacote”, talvez
    por uma inadvertida leviandade de quem
    aprovou a lei: indígenas e camponeses só
    têm em comum o fato de viverem longe das
    regiões não urbanas do País.
     
    Nesta coluna, quero recuperar um pou-
    co da história dos indígenas na ditadura
    em razão da extrema atualidade do so-
    frimento do povo Yanomâmi, assolado,
    agora, não pela invasão de suas terras a
    mando dos governos militares – as gran-
    des obras de “integração” da Amazônia –,
    mas pela destruição de seus meios de sub-
    sistência pelo garimpo ilegal.
     
    Segundo a estimativa de pesquisado-
    res do nosso grupo de trabalho na CNV –
    Inimá Simões e Vincent Carelli, além da
    valiosa contribuição do Instituto Socio-
    ambiental –, ao menos 8 mil indígenas
    foram mortos na ditadura. “Mas como?”,
    nos perguntavam. “Os índios lutaram con-
    tra os militares”? Não, eles nem sequer
    sabiam que viviam em um país chamado
    Brasil, com um governo muito diferen-
    te daquele composto por suas lideranças.
     
    Como, então, morriam os índios cujas
    terras foram invadidas na ditadura? De
    causas corriqueiras. Morriam de gripe, de
    sarampo, de catapora, de varíola. Viven-
    do isolados, eles não dispunham das mes-
    mas defesas imunológicas que os brancos.
    Nesses casos, doenças banais podem ser
    fatais. Os líderes das frentes de aproxima-
    ção pediam ao governo para enviar remé-
    dios e vacinas, mas o descaso com os po-
    vos originários era completo
     
    Um descaso semelhante, por sinal, ao
    manifestado pelo ex-presidente (ufa!) Jair
    Bolsonaro em relação às 600 mil vítimas
    da Covid-19. Seu desprezo pelos povos ori-
    ginários lembra uma antiga declaração do
    ministro do Interior Rangel Reis, em 1976:
    “Os índios não podem impedir a passagem
    do progresso. (...) Dentro de dez a 20 anos
    não haverá mais índios no Brasil”.
     
    Na CNV, entrevistamos um sertanis-
    ta chamado Antônio Cotrim, que à época
    da ditadura se demitiu da Funai, um em-
    prego com estabilidade garantida e bem
    remunerado, para denunciar a negligên-
    cia do regime à revista Veja. “Não quero
    ser coveiro de índios”, justificou na oca-
    sião. Acrescento, aqui, o depoimento de
    Davi Yanomâmi, válido tanto em relação
    às violações sofridas pelo seu povo hoje
    quanto no tempo da ditadura:
     
    Eu não sabia que existia governo.
    Veio chegando de longe até a nossa ter-
    ra, são pensamentos diferentes de nós.
    Pensamentos de tirar mercadoria da terra:
    ouro, diamantes, cassiterita, madeira,
    pedras preciosas. Matam árvores, destroem
    a terra mãe, como o povo indígena fala. Ela
    é que cuida de nós. Ela nasceu, a natureza
    grande, para a gente usar. Eu não sabia que
    o governo ia fazer estradas aqui. Autoridade
    não avisou antes de destruir nosso meio
    ambiente, de matar nosso povo. Não só os
    Yanomâmi, o povo do Brasil. A estrada é um
    caminho de invasores, de garimpo, de agri-
    cultores, de pescadores. Estradas que o go-
    verno construiu começaram lá em Belém,
    depois Amapá, Manaus, Boa Vista. Mata-
    ram nossos parentes Waimiri-Atroari. É
    trabalho ilegal. O branco usa palavra ilegal.
     
    A Funai, que era pra nos proteger, não
    nos ajudou nem avisou dos perigos. Hoje
    estamos reclamando. Só agora está acon-
    tecendo, em 2013, que vocês vieram aqui
    pedir pra gente contar a história. Quero di-
    zer: eu não quero mais morrer outra vez. O
    governo local e nacional, deputados, sena-
    dores, governadores, todos têm que pensar
    como o governo vai nos proteger, e não dei-
    xar mais destruir matas e rios e fazer sofrer
    os Yanomâmi e outros parentes, junto com
    a floresta. O meio ambiente sofre também.
     
    Minha ideia: ando no meu país, o Brasil.
    Sou filho da Amazônia, conto para quem
    não sabe o sofrimento do meu povo. Não que-
    remos que a autoridade deixe estragar outra
    vez. Se o governo quer estrada na terra
    Yanomâmi, tem que conversar com nós, jun-
    to com o Ibama. O governo Dilma está apron-
    tando para estragar outra vez. Nosso povo
    não quer. A autoridade tem que respeitar a
    Constituinte que o governo passado criou.
    CARTA CAPITAL

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