Era Messi, era Mané, era Chaplin
Por um momento, o Planeta Bola parou aos 69 minutos de jogo entre Argentina e Croácia no estádio de Lusail, Qatar, com quase 89 mil torcedores.
Camisa 10 às costas, o argentino Lionel Messi recebeu a bola pela direita, quase na área e percebeu que o jovem, de 20 anos, e brilhante zagueiro Josko Gvardiol, se aproximou.
Aí aconteceu estranha metamorfose para quem tem olhos capazes de ir além do que veem.
A camisa de listras azuis e brancas virou preta e branca (ou seria amarela?) e o 10 virou 7.
Não era Lionel quem estava ali, mas Manoel.
Lionel Andrés Messi Cuccittini encarnava Manoel Francisco dos Santos. Virava Mané Messi, Lionel Garrincha.
Com a bola nos pés, pressionado pelo assustador zagueiro croata, 1,85 m, de máscara ainda por cima, Messi, 1,69 m, a mesma altura de Mané Garrincha, fingiu que a devolveria para trás, pedalou em cima dela, girou o corpo em direção à linha de fundo e o Maracanã veio abaixo, enquanto, em desespero, Josko virava João e Mané Messi escapava dele para entregar o gol ao companheiro Julián Álvarez. Ou seria Vavá?
Foram sete segundos, exatamente sete segundos e se foram seis ou oito não importa, porque o tempo serve pouco para medir a perfeição, porque o tempo não pára (com acento, por favor), embora, no caso, tenha parado, congelado, para explodir em aplausos, em êxtase, em alegria, em euforia, emoção transbordante, como raras vezes nesta Copa já imortalizada pelo lance chapliniano.
Pouco importa se ali cabia uma porção de recordes, de estatísticas, de números frios, desses que fazem a felicidade dos contadores.
Contador relevante, perdoem os contabilistas, aí, tem de ser Carlos Drummond de Andrade, Paulo Mendes Campos, Vinícius de Moraes, Armando Nogueira, Nelson Rodrigues.
O que dariam para estar presentes no instante mágico em que Messi virou Mané, ele com tantos momentos de Diego Maradona, do Rei Pelé?
Lusail viveu, para precisos 88.996 felizardos, o encantamento inesquecível de quem poderá lembrar para sempre, e contar eternamente, que estava lá, de corpo presente e enriqueceu o espírito como se testemunhasse recital de Carlos Gardel no Teatro Colón.
Como é bom saber que toda essa gente vive, que Garrincha ressuscita, que Gardel canta cada vez melhor, porque Messi está aí, para nos lembrar que a genialidade é imortal.
Gracias a la vida!
FOLHA