Diario da Copa - 19

 

de Rafael Campos Rocha

No futebol, como na arte, é necessário o desequilíbrio para se alcançar alguma coisa além do treinamento e do mero formalismo instrumental. É o desequilíbrio é o algo mais, o fio propositadamente puxado pelo tecelão persa em seu tapete irretocável, o defeito pelo qual nos apaixonamos por uma pessoa, como nos explica o poeta em "muito Barulho por Nada". Uma equipe equilibrada não tem uma aresta aguda, uma parede áspera que possa usar para ferir seu adversário. No tiki-taka campeão da copa de 2010 havia Iniesta, que insistia em dribles plásticos, na maior parte das vezes contra-producentes, mas que desequilibravam o próprio time e, portanto, o time adversário. 

 

Quando Morata abandonou sua posição de centroavante que deveria dar trombada, cotovelada e mordida - e levar cusparadas, chutes e tapas - dentro da área, para ficar trocando passes decorativos com seus amiguinhos fora dela, a espanha foi condenada. O time espanhol acreditou nas próprias qualidades e abandonou a angústia e incompletude necessárias para se pintar um quadro, tocar um violão ganhar uma copa ou dar um beijo na boca, que seja. Gente equilibrada não serve nem pra levar o filho na escola.

 

Já Portugal tem angústia de sobra e foi o resultado que mais me surpreendeu na copa, até aqui. Sempre achei que o time fosse ficar a mercê dos caprichos personalistas de CR7, que em um dós de peito de audácia de seu técnico acabou ficando no banco. Sua ausência foi responsável pelo jogo mais espetacular na copa até agora, alçando o meia Bruno Fernandes ao pódio de 3° melhor jogador da competição e o atacante João Felix à categoria de meia armador efetivo. O time de portugal, que já era divertido de se ver, ficou ainda mais alegre, com seus jogadores de ataque disparando com a bola dominada de um lado para o outro - um pouco sem rumo, é verdade - e seus zagueiros dando trombadas emocionantes lá atrás. Na imagem, uma medida de sal da Reconquista.