A serpente de Essex': série excelente com Claire Danes
Patrícia Kogut
Esqueça a atormentada agente da CIA Carrie de “Homeland”. O papel deu o Emmy e o Globo de Ouro a Claire Danes. Agora, ela está de volta ao ar em “A serpente de Essex”, série que chegou à Apple TV+. É outra personagem, em uma nova cronologia e até num país diferente. Esperta a atriz, que se defendeu assim dos perigos de ficar prisioneira de um grande sucesso. Claire só conservou o talento e a entrega de sempre para viver Cora Seaborne, a protagonista.
O enredo é adaptado do romance homônimo de Sarah Perry. Ele nos carrega para o fim do século XIX, quando “A origem das espécies” era um lançamento recente, mas o darwinismo já estava difundido entre os mais esclarecidos. Os hospitais das cidades europeias importantes tinham seus “teatros cirúrgicos”. Neles, no centro de uma arena ocupada por jovens estudantes, os primeiros cirurgiões exploravam a anatomia humana enquanto as protoanestesias mantinham os pacientes adormecidos. Era um tempo de progresso para a medicina. Somos apresentados a Cora em sua casa em Londres, com o marido no leito de morte. Ela recusa o tratamento que o Dr. Luke Garrett (Frank Dillane) oferece. A viuvez não será um peso, ao contrário, representará a libertação de um casamento infeliz.
Dona de um espírito iluminista, ela devora livros de ciência, se interessa pelos avanços e é cheia de energia. Torna -se amiga do médico, que compartilha desse interesse irrestrito pela novidade. É neste momento que os jornais noticiam que uma serpente mítica teria ressurgido na região de Essex depois de três séculos sem aparecer. Os moradores estão apavorados. Para piorar, uma moça aparece morta. A tragédia é atribuída ao monstro.
Cora não pensa duas vezes e segue para lá com o filho Francis, de 11 anos, e Martha (Hayley Squires), a babá do menino e sua melhor amiga. O lugar é uma espécie de Avalon, um fim de mundo envolto em brumas, próprio para as lendas prosperarem. Cora acredita que possa ser um “fóssil vivo”, um ictiossauro que escapou das pressões evolutivas. Ela se liga ao vigário local, Will Ransome (Tom Hiddleston). Ele aposta na imaginação do povo e defende que tal monstro não existe. Em que pesem todas as alegorias envolvendo as serpentes desde Adão e Eva, o tema da série é a oposição entre o obscurantismo religioso e a ciência.
O enredo arma uma teia complexa. Assim, transporta o espectador para o pântano onde se afundam os personagens. Não importa que algumas das dúvidas do século XIX tenham sido superadas pelos progressos científicos. São velhas questões humanas e medos que se renovam. É o que a serpente desta ficção simboliza. A série é excelente e merece toda a sua atenção.
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