Golpe de Bolsonaro fracassou, mas acordão impediu que instituições funcionassem
Celso Rocha de Barros
Max Weber diria que “instituições são coisas que mandam Bolsonaro pra cadeia quando ele é pego em flagrante tentando golpe de Estado”. Ainda segundo o autor de “Economia e Sociedade”, “o resto são aqueles velhos puteiros de Copacabana em que policial corrupto negociava suborno com o tráfico”.
Douglass North, fundador do paradigma institucionalista na economia, celebremente teria dito, em seu discurso de aceitação do Nobel de 1993, que “se não prender o Jair em flagrante não é instituição, é coisa de corno”.
No final da noite de terça-feira, o Brasil inteiro tinha visto Bolsonaro tentando o golpe. Ninguém na imprensa se referiu ao golpismo como qualquer outra coisa. A esquerda, o centro e a direita, o mercado financeiro e o PSTU, a maioria que torcia contra e a minoria que torcia a favor, todos reconheceram facilmente o que viam com seus próprios olhos. Os caminhoneiros desolados diziam abertamente que foram chamados ali para dar um golpe e o golpe não veio.
O golpe deu errado. A ideia da manifestação era convencer militares e PMs de que um golpe seria popular mesmo partindo de um governo com 60% de rejeição. Não convenceram. Sem papai milico ou mamãe PM para brigar por eles, os bolsonaristas foram para casa xingar jornalista mulher no Twitter.
Nos dias 8 e 9, a discussão sobre impeachment avançou aceleradamente, apesar do colaboracionista Arthur Lira. O PSD de Kassab montou comissão para discutir o impeachment. O PSDB se declarou oposição a Bolsonaro. O mercado financeiro colocou-se contra a turbulência golpista. Fux e Barroso deram declarações contundentes deixando claro que Jair estava ferrado. Estava mesmo. Seu governo tinha acabado.
Eram elas, as instituições funcionando, de volta após longa ausência e quase 600 mil brasileiros mortos.
E, nesse momento, quem entrou em cena para garantir que o referido funcionamento não ameaçasse o supracitado puteiro? Michel Temer,
é claro, quem mais? O sujeito que deu início à crise em 2016 e trouxe
os militares de volta à política brasileira em 2018, o chefe do PMDB da
Câmara em quem os liberais amarraram seu programa em 2016 no auge da
Lava Jato, o que lhes rendeu 4% nas eleições de 2018 e a perda da vaga
no segundo turno para Jair Bolsonaro.
A carta “foi mal, tava doidão” ofereceu a Bolsonaro uma rota de fuga, e,
aos esquemas de Arthur Lira, uma chance de sobrevivência.
O acordão de Temer
não impediu o golpe, que já estava derrotado. Mas pode ter melado o
impeachment. Temer interrompeu o jogo quando era a vez da democracia
jogar. A turbulência que Temer poupou ao mercado não foi a turbulência
do fim da democracia, foi a turbulência da reação da democracia.
Não me entendam mal, as notícias são boas. A democracia brasileira sobreviveu ao ataque mais frontal que sofreu desde o fim do regime militar. Mas se o acordão contra o impeachment prosperar, não teremos de volta nossa democracia saudável de alguns anos atrás. Teremos voltado só até o dia 6 de setembro de 2021.
FOLHA