Túlio Maravilha e o fim da CPI
Bernardo Mello Franco
Túlio Maravilha foi ídolo no Botafogo, vestiu a camisa da seleção e, segundo suas próprias contas, atingiu a marca dos mil gols. Mais tarde, virou sinônimo de jogador que não soube a hora de parar.
Para retardar o fim da carreira, o artilheiro atuou em clubes modestos como Nerópolis, Itumbiara, Laranjal e Potyguar de Currais Novos. Pendurou as chuteiras na segunda divisão mineira, num jogo testemunhado por apenas 36 torcedores.Na terça-feira, o exemplo de Túlio foi citado numa reunião da cúpula da CPI da Covid. Os senadores prometeram não repetir a despedida melancólica do atacante. Querem sair de campo antes que as luzes do estádio se apaguem.
Os sinais de esvaziamento da comissão ficaram claros na semana passada. O interesse do público caiu, e a investigação perdeu espaço no noticiário. Ao mesmo tempo, o governo reforçou os esforços de cooptação parlamentar. A maioria oposicionista entrou em risco.
O último alerta soou na segunda-feira, quando o deputado Luis Miranda indicou que poderia recuar do depoimento que ligou Jair Bolsonaro ao escândalo da Covaxin. A CPI sentiu cheiro de sabotagem, cancelou sua acareação com o ministro Onyx Lorenzoni e resolveu apressar o fim dos trabalhos.
O senador Renan Calheiros deve antecipar seu relatório para a segunda quinzena de setembro. Vai pedir o indiciamento de Jair Bolsonaro pela prática de ao menos seis crimes, cujas penas somam mais de 30 anos de prisão.
O senador Flávio Bolsonaro, que abriu as portas do BNDES ao dono da Precisa Medicamentos, será enquadrado por advocacia administrativa. Resta decidir se o vereador Carlos Bolsonaro, o Zero Dois, entrará no capítulo sobre a difusão de notícias fraudulentas na pandemia.
Em menos de quatro meses, a CPI iluminou os porões do desgoverno na pandemia. A investigação revelou o funcionamento de um gabinete paralelo e flagrou ao menos duas negociatas na compra de vacinas.
O último desafio dos senadores é evitar que o relatório morra na gaveta do procurador Augusto Aras. O caminho natural seria barrar sua recondução, mas a maioria da CPI não está disposta a comprar essa briga.
O GLOBO