Para Bolsonaro, disputar a eleição nas urnas é só um plano B

Jair Bolsonaro fez uma exibição pública de seu arsenal golpista ao longo da última semana. Pressionado por suspeitas de corrupção e pela perspectiva de uma derrota nas urnas, ele renovou suas ameaças explícitas à democracia e disse, despreocupadamente, que o país pode não ter eleições no ano que vem.
O presidente desfila com a certeza da impunidade. Bolsonaro espalha suspeitas falsas de fraude nas urnas eletrônicas há mais de um ano e avisa a quem quiser ouvir que está disposto a comandar um levante se for derrotado nas próximas eleições. Praticamente ninguém o incomodou ao longo dessa campanha.
Até aqui, Bolsonaro teve o consentimento de personagens que têm a chave para sua sobrevivência imediata. O procurador-geral da República, que deveria investigá-lo, não viu nada de errado em mais essa coletânea de ataques. Já o presidente da Câmara e os bem alimentados parlamentares de sua base acreditam que tudo deve continuar como está.
Graças a essa boa vontade, Bolsonaro operou nas bordas do autoritarismo ao longo do mandato. Se não cruzou a fronteira, não foi por desinteresse, mas por falta de força política. Agora, é seu enfraquecimento que o empurra para o outro lado. Na prática, o presidente já abandonou o território democrático.
A movimentação de Bolsonaro surgiu no radar de duas autoridades na última sexta-feira (9). O presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, afirmou que agir para impedir as eleições é crime de responsabilidade. O presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (DEM), classificou como "inimigo da nação" aquele que patrocina retrocessos dessa natureza.
Na articulação golpista, Bolsonaro usa a desculpa de que está em busca de "eleições limpas". As eleições, no entanto, deixaram de ser limpas no momento em que o presidente da República passou a ameaçá-las, com a guarida dos comandantes militares.
Bolsonaro pode até vencer nas urnas (o que parece cada vez menos provável), mas ter mais votos do que seus adversários é só um plano B.