PASQUIM HA 50 ANOS
A MULHER SEGUNDO VINICIUS
Foi Tarso de Castro quem, sobre a mulher, disse que se
inventarem coisa melhor ele não quer nem saber. Dito sábio e prudente, porque a
mulher, como a lua, tem que ser amada de longe, irracionalmente e sem reservas,
e coberto de preocupações outras sobre o seu mistério que não sejam as de
constatá-lo e aceita-lo como o crente aceita Deus ou Obatalá, a quem ninguém
até hoje foi apresentado.
Amada de longe em seu mistério. Digo isso porque dele
despida, em geral a mulher se despersonaliza e transfere, passando a mostrar
toda essa extensa fama de “qualidade negativas” que lhe são inerentes e
determinadas pelo seu condicionamento à função de procurar e exercer “prendas
domésticas”, como ela preenche nos formulários.
Quando eu digo amada de longe, isso não indica qualquer platonismo na relação:
muito pelo contrário. Porque tudo o que a mulher quer mesmo é ser bem amada e
possuída: e quanto mais, melhor. O que o homem nunca deve fazer é desnudá-la
demasiado, ou seja, além do corpo, a alma; ou como se queira chamar ao
substrato íntimo. Pois é muito leve o maravilhoso tecido de tramas de que a
mulher é feita, e com que a natureza soube encobrir seus poderosos fios-terra,
como que para disfarça-la melhor em seu encanto, que faz a paixão dos homens.
Uma vez postos a nu, vai-se o mistério, vai-se o encanto.
Para a mulher o amor é a coisa mais importante da
vida. Ele é a sua motivação máxima, o eixo de sua existência, sua razão maior
de ser. É no amor que ela mais desabrocha e melhor mostra seu universo de
beleza. O amor parece capitalizar todo o magma disperso de paixões latentes que
constituem a sua essência , e a mulher se incendeia toda numa só paixão: a do
ser amado. Todos os seus atos passam a se norteados em função desse sol único.
Não há nada mais belo que curtir o espetáculo de uma
mulher vivendo o seu amor. Ela fica, ao mesmo tempo, intensa e transparente.
Seu olhar adquire uma luz macia e parece interiorizar-se, como se estivesse
sempre a perscrutar o próprio intimo, e a beleza do que visse não pudesse ser
revelada. Todos os seus gestos traduzem a posse de um segredo indizível, que é
preciso guardar a qualquer preço, pois que todos o querem descobrir. E ao mesmo
tempo que sua beleza física explode, ela fecha-se no claustro de seu amor, que
quer só para ela porque, de repente, tudo fica frágil, imensamente frágil.