Fragmentos de textos e imagens catadas nesta tela, capturadas desta web, varridas de jornais, revistas, livros, sons, filtradas pelos olhos e ouvidos e escorrendo pelos dedos para serem derramadas sobre as teclas... e viverem eterna e instanta neamente num logradouro digital.
Desagua douro de pensa mentos.
terça-feira, outubro 11, 2016
PEC 241, VEDAÇÃO DE RETROCESSOS E DISCRICIONARIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
de CAIO ALMENDRA
Quando eu estava na segunda infância, ali nas carteiras da faculdade de
Direito, o titio Barroso comentou sobre um conflito na interpretação
constitucional entre o "princípio da vedação do retrocesso" e
"discricionariedade da administração pública".
Eu não sou
revanchista e não quero que ninguém passe pelo calvário que passei na
faculdade de direito. Vou tentar ser claro e histórico para explicar de
forma mais simples a questão. Perdoem-me se falhar.
A
Constituição brasileira é sobrinha da constituição portuguesa, criada
pela Revolução dos Cravos. Nosso constitucionalismo também. Essas
constituições, além de consagrar os princípios
constitucionais básicos
das revoluções burguesas do século XVIII e XIX. Ou seja, além de
consagrar direitos básicos como "liberdade", "prisão apenas com provas" e
etc(chamados de "direitos negativos", porque exigiam do estado um
não-fazer), também continha "direitos positivos", deveres do estado para
com todos os cidadãos, como saúde, educação, proteção ambiental e etc.
Acontece que a Constituição Brasileira foi escrita às vésperas da Queda
do Muro e do "Consenso de Washington". O neoliberalismo vinha forte e o
que era uma obrigação do estado começou a ser mitigado. Esses direitos
sociais, portanto, tinham que ser atropelados, apesar de constarem na
Constituição. Nem o ideal de sua execução pelo estado poderia
sobreviver. Nesse momento, se fortaleceram as ideias de "reserva do
possível", isto é, da ideia de que esses direitos fossem garantidos
apenas na medida das possibilidades econômicas(afinal, juristas
acreditam piamente que a crise econômica é uma catástrofe e não uma
consequência de nosso sistema econômico e um elaborado plano de redução
de direitos dos mais pobres...).
Por outro lado, surgia a ideia
de que se não é possível melhorar os serviços públicos a ponto de se
garantir o que o texto constitucional previa, ao menos deveria existir
uma proibição de que o que está insuficiente não piorasse. Era uma
trincheira da doutrina jurídica contra o avanço do neoliberalismo.
Contra a vedação de retrocessos, fortalecia-se outro conceito, o da
"discricionariedade da administração pública". Para os defensores desse
princípio, era necessário que os eleitos pudessem governar, pudessem
executar o programa para o qual foram eleitos. Assim, um presidente
excessivamente travado pela exigência de garantir direitos sociais
mínimos não conseguiria governar, e a constituição governaria por ele,
cassando a pluralidade democrática e o poder do voto.
Preciso nem dizer de que lado eu estou dessa história... Mas, vejamos a situação da PEC 241 nisso tudo.
A "PEC do fim do mundo" consegue, simultaneamente, atacar os direitos
sociais, reduzindo a verba para a saúde, educação e etc, e ferir de
morte a discricionariedade da administração pública, determinando hoje
como 20 anos de governos futuros deverão administrar os recursos
públicos. Não importaria o quanto votássemos a favor de presidentes que
prometessem mais saúde, educação e etc, quem decidiria seu governo seria
o atual congresso.
Eu realmente espero que o ex-titio Barroso,
atual ministro do STF Barroso, junto com muitos constitucionalistas que
escreveram sobre esse conflito(a começar pelo Gilmar Mendes, que já
declarou-se a favor da PEC), declarem inconstitucional essa medida.