Fragmentos de textos e imagens catadas nesta tela, capturadas desta web, varridas de jornais, revistas, livros, sons, filtradas pelos olhos e ouvidos e escorrendo pelos dedos para serem derramadas sobre as teclas... e viverem eterna e instanta neamente num logradouro digital.
Desagua douro de pensa mentos.
terça-feira, março 30, 2010
Fala, Panga! - Homenagem ao Glauco
Artistas participantes:
Adão Iturrusgarai, Airon Alcy, Allan Sieber, Angeli, Arnaldo Branco,
Benett, Chiquinha, André Dahmer, Dálcio, Emílio Damiani, Galvão, Luiz
Gê, Fernando Gonsales, Gustavo Duarte, Jaguar, Jean, Leonardo, Mariza,
Nani, Orlando, Paulo Caruso, Pelicano, Solda, Spacca, Tiago Recchia,
Ziraldo.
Texto do curador da exposição, Orlando Pedroso Dizem que
para um avião cair, precisa haver a coincidência de pelo menos 5 erros.
Parece ser também o caso da triste e violenta morte do cartunista Glauco
e de seu filho Raoni ocorridas na semana passada. Não cabe a nós aqui,
agora, listar quais os erros que culminaram nesse drama de tamanha
proporção, nem buscar os culpados de mais uma tragédia como tantas que
acompanhamos diariamente nos noticiários. Talvez este seja o momento de
listarmos os acertos, especialmente porque foram conduzidos pelo talento
e pela coragem. Uma coragem inconsciente, é verdade, mas ainda assim
coragem. O Glauco não sabia fazer de outra forma porque era movido quase
que instintivamente a agir e criar sem as amarras ou limitações sociais
que norteiam o mundo adulto. Ele criava como se fosse uma criança e
fazia assim porque era o que ele tinha que fazer.
Em 1978 eu estava terminando o colegial, era um aspirante a ilustrador,
cartunista e acompanhava a segunda fase do Pasquim, a reforma gráfica do
Jornal da Tarde e, claro, a página Vira-Lata publicada no suplemento
Folhetim, da Folha de S.Paulo e editada pelo Angeli.Lá estavam, além do
próprio Angeli, Laerte, Alcy, Nilson, Jotinha e outros que aproveitavam o
início da abertura política para espinafrar o que ainda sobrava da
ditadura militar.Era um humor pesado, rancoroso e engajado. Era.
Nesse ano surgiu nas páginas do Vira-Lata um outro desenho, um outro
humor. Aliás, um humor engraçado, leve, cheio de movimento e delicadeza.
Era o Glauco que trazia novos ares e um espírito que iria mudar de vez a
forma de se trabalhar a charge e o cartum na imprensa brasileira. Esses
cartuns não respeitavam nada. O preso passava o pé na bunda do guarda, a
menina deixava escapar na mesa do almoço que fizera um aborto dias
atrás ou que tinha vários namorados, o defensor do feminismo pedia para a
namorada pagar a conta do restaurante e o guardinha de trânsito botava
ordem no cruzamento onde havia uma passeata vindo de cada lado.O peso de
se fazer uma charge desaparecia e se tornava algo prazeroso e
divertido. De 79 a 81 tive o prazer de passar algumas madrugadas
acompanhando o fechamento das edições do Folhetim na sala onde também
estavam o Fortuna, Faustinho, Maringoni, Luiz Gê. Em 1983 ele passou a
publicar o Geraldão na sessão de tiras do jornal. O primeiro de uma
série memorável de personagens que passariam a fazer parte da história
dos leitores da Folha assim como de milhares de jovens que passavam a
consumir o novo quadrinho que surgia. Em 1985 voltei a encontrar o
Glauco na redação. Pouco depois ele passaria a fazer as charges. "E aí,
panga?" Era como ele chegava nos colegas antes de desfiar um rosário de
piadas e expressões sempre particulares e muito engraçadas. Eram, muitas
vezes ingênuas, quase infantís mas sempre imprevisíveis e,
provavelmente, não há pessoa que tenha trabalhado ou convivido com ele
que não tenha pelo menos uma dezena de pequenas histórias tendo o Glauco
como personagem.Gênio, amigo, figurinha carimbada, nosso John Lennon,
não importa. O que fica agora é sua obra, a capacidade de contar a mesma
piada centenas de vezes e de ela ser sempre boa, o talento de ter
conseguido empurrar ladeira abaixo velhos padrões de comportamento e de
conseguir com seu traço econômico que nosso mundo, o dos leitores, se
tornasse muito melhor. Serviço:
PIZZA do BABOO abertura dia 30 de março de 2010 - a partir das 20h
até 30 de maio, de terça a domingo, das 18h às 23h30
Curadoria: Orlando Pedroso
r. Joaquim Antunes, 824 - Pinheiros
Fones: 3064 8282 e 3082 9065