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  • O BRASIL EH O QUE ME ENVENENA MAS EH O QUE ME CURA (LUIZ ANTONIO SIMAS)


  • domingo, setembro 05, 2004



    QUANTA DESGRAÇA NUM DIA!

    Sexta-feira foi de lascar. Às seis e pouco da manhã fui acordado pela notícia de que Derbi tinha morrido.
    Derbi era um rapaz que foi morar lá em casa e foi criado pelos meus pais.
    Tem gente com mania de achar bichinhos perdidos pela rua e levar pra casa.
    Gatinhos, cachorros, passarinhos, outros...
    Meus pais pegavam pessoas que nao tinham recursos e cuidavam delas, dando uma família, comida, educação, iam morar com a gente lã em casa, e quando cresciam e arrumavam uma vida e saíam meus pais continuavam dando ajuda e orientação.
    Derbi era uma dessas pessoas. Então era como se fosse pra mim tipo um meio-irmão ou um irmão adotivo.

    Em seguida veio a notícia da morte do Aser, que era um antigo companheiro do meu pai.
    Eu e o Luke entao acordados ficamos acompanhando ao vivo as cenas tragicas e horrendas quando tudo destrambelhou na escola de Beslan
    crianças e adultos correndo em meio ao tiroteio, alguns caindo atingidos, talvez mortos
    criancinhas nuas e desvalidas de fome e sede e calor e sendo carregadas ou tropegas pelo cenário
    sangue sangue sangue explosoes & tiros
    maes levantando pontas dos lençois sobre os defuntinhos conferindo rostos vendo se eram seus filhos

    Bezerra da Silva continua mal na UTI com enfizema pulmonar. Luke então contou que Tom Capone tinha morrido num acidente em Los Angeles.

    Corri de volta para Paquetá, mas ao fim da tarde chegou lá a noticia de que Wilma, minha primeira esposa e companheira por quase 20 anos, caira na rua na Tijuca com o peso do corpo sobre o meio-fio fraturando o braço em dois lugares. Um deles com exposta, osso rompendo pra fora da pele.

    Chamaram o Corpo de Bombeiro e ela foi atendida. Colocaram o braço no lugar e puseram uma tala e disseram que ela seria removida para o Hospital do Andaraí. Temerosa do serviço público, ela disse que preferia ser levada para o Santa Terezinha, que inclusive ficava a uns quatro quarteirões de onde ela estava (e um dos hospitais ortopédicos coberto pelo seu plano de saúde).

    Os bombeiros disseram então que não poderiam levá-la - tem uma norma de que não podem transportar feridos para hospitais particulares - e - numa atitude que achei insólita - tiraram a tala de seu braço, que voltou novamente a ficar exposta e capenga, e levaram tala, ambulancia e seus serviços embora.

    Ele ficou ali na calçada um bom tempo, sentindo dores absurdas, sem poder mexer o braço, e sem poder nem tentar se levantar ou caminhar pois na queda (ou causando a queda, nao sabemos) a perna mecânica que ela utiliza se soltou e ela ficou perneta e com a dor e um braço só não conseguiria colocá-la de volta.

    E outro dado insólito foi então ela permanecer ali por um bom tempo nessa situaçao e ninguem se oferecer para levá-la ao hospital - nem taxis pagando a corrida - ou chamar uma ambulancia particular ou ajudá-la a colocar a perna, alguma coisa. Finalmente ela conseguiu que alguem ligasse para sua irmã, que mora na Tijuca, e Cristina chegou com o carro do noivo da filha e transportou Wilma para o Santa Terezinha, onde entrou em cirurgia no braço.

    O resto do tempo fiquei aguardando novas bombas cairem. Quando meu pai me ligou dos EUA pensei que fosse notícias do furacao mas tranquilizou que só vai para a Flórida na outra semana. Pelo menos uma filha me ligou da Inglaterra contente para falar de seu primeiro dia de trabalho no National Health Service e outra ligou animada de Santa Tereza contando de sua primeira nota de divulgação emplacada nos jornais.

    O mundo é muito confuso.

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